domingo, 31 de outubro de 2010

O Almirante e o Doutor

Acho que o marinheiro João Cândido Felisberto ficaria feliz ao saber que um século depois da revolta que comandou o Brasil elegeu uma mulher presidente, depois de ter sido governado durante oito anos por um operário – um operário doutor na arte de governar, assim como o marinheiro tornou-se um verdadeiro almirante dos mares. Em maio passado, o Almirante foi homenageado pelo Doutor, que batizou com seu nome o primeiro navio da nova frota da Transpetro lançado ao mar. Foi o primeiro navio feito no Brasil para a Petrobras, em 13 anos. Petrobras, João Cândido, Lula, Dilma. Tem um Brasil sendo desenhado nestes "pontos de bordado", um Brasil diferente daquele feito pelos doutores e almirantes que não merecem seus títulos, um Brasil melhor.
Tomo a ideia do bordado emprestada do historiador José Murilo de Carvalho, um dos nossos mais brilhantes historiadores, autor do ensaio Os bordados de João Cândido, sobre o herói da Revolta da Chibata. O Almirante Negro.

A violência das elites governantes: cal nos marinheiros da república, cal nos insurgentes da independência.

A mentira das elites: a anistia não honrada. O batalhão de escravos Lanceiros Negros desarmados pelos farrapos e massacrados pelo exército imperial.

As mentiras de Serra. Enganar o povo não é constrangimento para as elites, que dependem apenas do seu voto e fazem qualquer coisa por ele. A qualidade do Lula é sobretudo esta, de não ter enganado o povo. Não é preciso ter nascido nas classes dominantes para ser seu representante, basta adotá-la; foi o que Lula não fez, não traiu sua origem.

A chibata: 22 anos depois do fim da escravidão, os marinheiros ainda apanhavam como escravos. Hoje ainda trabalho escravo (Repórter Brasil). Pediam liberdade e cidadania.

O lema dos marinheiros: Ordem e Liberdade.

A violência no Brasil nunca vem do povo, mas contra o povo, amoroso, ordeiro, mas sem liberdade, sem direito, sem cidadania.

A imagem do brasileiro cordial é verdadeira, mas nossa história, ao contrário do que se conta, é de muita violência. (A lista Todas as rebeliões populares foram punidas com crueldade.

sábado, 30 de outubro de 2010

Que floresçam cem Folhas!

O governo Lula e de forma mais intensa a campanha eleitoral deste ano fizeram desmoronar um paradigma no qual formaram-se os jornalistas brasileiros desde a década de 1970, o da imparcialidade da imprensa. A partir de agora, assim como cabe ao novo governo rever o atual modelo de comunicação no país, cabe aos cursos de jornalismo mudar as referências que regem a formação do profissional.
Não me refiro às mudanças tecnológicas, um fenômeno paralelo, que merece análise específica. Refiro-me ao modelo liberal de imprensa, que o jornalismo brasileiro segue, desde sempre talvez, mas predominantemente a partir do final dos anos 70. Nesse modelo os jornais pairam acima de facções, a serviço da sociedade, um serviço democrático, tão importante que foi chamado de quarto poder. O que os últimos anos mostram é que, entre nós, esse modelo não é um valor social de bases firmes e duradouras: a "grande" imprensa brasileira funciona de acordo com a conjuntura política.
É verdade, desde sempre também talvez, que a imparcialidade de imprensa é um mito, cuja duração se deve à crença geral de que teria mais valor do que outros. Vale aqui uma adaptação do que se diz sobre a democracia: "é o pior regime político, exceto os outros".
O modelo liberal é um modelo americano, não apenas de imprensa, mas de nação. Já o disse um historiador, trata-se de uma exceção na história mundial, embora tenha sido copiada por inúmeros países. A democracia americana talvez seja a jabuticaba dos EUA: uma preciosidade que só existe lá. E a imprensa americana faz parte dela. Não obstante os defeitos da imprensa empresarial, ela tem espaço para a expressão de todos os pensamentos. Trata-se de um valor democrático arraigado nos americanos – quanto disso os governos Bush destruíram é outra questão.
O fato é que foi esse modelo que a imprensa brasileira copiou e que prosperou a partir dos anos 70. É ele que os futuros jornalistas aprenderam na faculdade, nas últimas décadas. É compreensível: depois de muitos anos de ditadura, o desejo de liberdade de imprensa era forte. O modelo americano prosperou com a redemocratização, que continha na sua essência a pluralidade. Liberdade de imprensa se confundiu com liberdade de expressão, com liberdade de manifestação, com liberdade organização política. Assim como os dois partidos antes existentes (Arena e MDB) foram implodidos e dezenas de outros surgiram, assim como movimentos de defesa dos interesses de todos as classes, grupos, raças e sexos se formaram, também a imprensa deu voz a todas os pensamentos.
Caso exemplar dessa transformação é a Folha de S.Paulo. Jornal que fez oposição ao governo João Goulart e apoiou o golpe militar de 1964, cedendo-lhe, inclusive, veículos para transporte clandestino de presos políticos, a partir de meados da década de 1970 a Folha passou a proclamar sua independência editorial, manifestada em slogans como "de rabo preso com o leitor". Noticiou o movimento estudantil de 1977, as greves operárias do ABC, em 1978, e todas as manifestações contra o regime militar, culminando no apoio à campanha Diretas já!, em 1984.
Pode-se se argumentar que a Folha é uma empresa capitalista que quer ganhar dinheiro e viu nos movimentos de oposição um novo mercado que a faria crescer. Sentindo os novos ventos, largou o osso da ditadura e apostou na "abertura". Armou e se deu bem, pois se tornou o maior jornal do país, desbancando concorrentes tradicionais como o Estadão, prestigiosos como o JB, e fortes economicamente, como O Globo.
O que eu quero ressaltar é que o modelo ao qual a Folha se agarrou para crescer foi o modelo americano da imprensa imparcial, independente de interesses particulares. Prova disso está não apenas na cobertura dos movimentos populares, como também na ampliação de páginas de opinião e cadernos abertos à manifestação de diversos segmentos e pensamentos da sociedade. A redemocratização favoreceu o florescimento do modelo americano de imprensa e o grande mérito (empresarial) da Folha foi certamente perceber isso antes dos concorrentes.
Cabe aqui lembrar um fenômeno paralelo a esse movimento da grande imprensa, que foi o nascimento, crescimento e decadência da chamada imprensa nanica, ou imprensa alternativa. Eram conhecidos assim os pequenos jornais que circularam em grande número durante os anos 70 e cujo principal exemplo é o Pasquim. Pequenos em formato (em geral tabloides), em condições materiais (geralmente pequenas editoras formadas pelos próprios jornalistas e rodados em gráficas de terceiros) e em tiragem (alguns milhares de exemplares). Diante dessas precárias condições de funcionamento, eram jornais de circulação local e pouca duração (o Pasquim foi uma exceção que se tornou nacional, atingiu tiragem de centenas de milhares de exemplares e durou mais de década, sem, no entanto, deixar de ser "nanico"). No entanto, da mesma forma que um morria, outro nascia, e a imprensa alternativa, como fenômeno, atravessou a década de 1970.
O que dava fôlego a essa imprensa? Era exatamente a falência do modelo americano: tolhida pela censura prévia, a grande imprensa não podia expressar, nem no noticiário e muito menos em opinião, os setores de oposição ao regime. É verdade que, tendo apoiado o golpe militar, a grande imprensa não sofria muito com isso, na conjuntura dos anos 60 e começo dos anos 70. A longo prazo, porém, a censura era uma lástima, pois tolhia a essência do jornalismo, que é publicar informações. Ficaram famosos os sonetos de Camões e receitas culinárias publicados pelo Estadão em espaços que seriam destinados a matérias censuradas. O Estadão foi o jornalão que mais sentiu e mais reagiu à censura; não por coincidência, é o jornal brasileiro que, em toda sua centenária trajetória, mais se aproxima do modelo de imprensa americano.
A censura tornava a grande imprensa, aos olhos do leitor, ainda mais simpática ao regime do que ela era. E, na precariedade do noticiário, igualava-a, por baixo, aos jornais alternativos. Estes tinham mesmo algumas vantagens, pois feitos por jornalistas ou por políticos de esquerda, emplacavam notícias, ainda que de forma camuflada, que os jornalões não davam, e expressavam pontos de vista excluídos da grande imprensa. O próprio fato de terem vida curta e alcance limitado possibilitava que escapassem da censura prévia. Atingidos por ela, ganhavam notoriedade e credibilidade: eram censurados ou recolhidos porque diziam a verdade. O leitor tornava-se solidário a eles e acompanhava seus jornalistas em novas publicações.
Tudo isso ajuda a entender por que, justamente quando a censura prévia é extinta e os nanicos têm mais liberdade, em vez de crescer eles definham e morrem, não apenas como títulos, mas como fenômeno. (Um raro remanescente está aqui entre nós, o Cometa Itabirano, um pasquim balzaqueano.) A partir da abertura política, o modelo americano prospera, abrigando novamente o noticiário e as opiniões de toda a sociedade. Grandes empresas capitalistas, elas são concorrentes muito mais poderosas do que as pequenas editoras dos nanicos. Mesmo os jornalistas não veem mais muitas razões para preferir as franciscanas condições de trabalho na imprensa alternativa às chances de uma carreira na grande imprensa. Com o passar do tempo e o advento do neoliberalismo, aquele passado parece mesmo coisa de idealistas, qualidade em desuso.
O que o governo Lula e a campanha eleitoral de 2010, em particular, demonstram é que o modelo americano de imprensa não se firmou no país. A este respeito é exemplar o que disse, em entrevista a O Globo, em março deste ano, a presidente da Associação Nacional de Jornais, Maria Judith Brito, executiva da Folha: "Esses meios de comunicação estão fazendo de fato a posição oposicionista deste país, já que a oposição está profundamente fragilizada". Mais que um posicionamento político, que iluminou a cobertura dos jornalões na eleição presidencial de 2010, tal declaração é um atestado de falência do modelo liberal de jornalismo adotado pela própria Folha a partir de meados dos anos 70.
Se a independência não é valor para a "grande" imprensa, se em 2010 ela se coloca a serviço (não "do Brasil", como diz a Folha no seu cabeçalho, e sim) de uma facção política, da mesmo forma como em 1964 posicionou-se a favor do golpe que derrubou o presidente eleito e referendado João Goulart, é preciso que a democracia seja exercida além dela. É preciso que a imprensa se diversifique, é preciso que o leque de jornais – assim como de emissoras de televisão e rádio, segundo mecanismos próprios desses meios – se amplie para expressar todos as facções políticas. Dizendo de outra maneira: se a Folha não tem mais o rabo preso com o leitor, exclusivamente, pertença ele a uma façção ou outra, é preciso que existam outras "Folhas", capazes de dar voz às facções que a Folha não acolhe.
Aqui é preciso distinguir valores e princípios. A informação correta está acima das facções políticas. Todo jornal, seja ele simpático a esta fação ou àquela, tem como obrigação informar a verdade, não mentir, não distorcer fatos, não caluniar, não difamar. Este é um valor do jornalismo, segundo o qual a Folha (de S.Paulo e qualquer outra) estaria sujeita a sérias punições caso a democracia entre nós fosse mais robusta. Nenhum jornal, de uma facção ou de outra, tem o direito de mentir. Para isso, existe a lei, para isso o judiciário deve funcionar de forma rápida e imparcial, protegendo, mais que os adversários políticos, o cidadão comum. Outra coisa é a opinião, o enfoque, a linha editorial.
A Folha de S.Paulo tem todo o direito de defender a ideologia neoliberal, os interesses do capital, as políticas de direita. Tem todo o direito de combater ferozmente o governo Lula, assim como a candidatura Dilma. Este é um princípio que ajuda a construir e a reforçar a democracia. O que desequilibra a atuação da Folha – e com ela o Estadão, O Globo e a Veja, para ficar nos principais veículos da direita brasileira – é inexistirem outras 'Folhas' igualmente grandes, fortes e influentes, capazes de se contraporem ao seu poder e disputarem a preferência do leitor, democraticamente, apresentando linhas editoriais distintas. O que desequilibra a atuação da "grande" imprensa é o fato de servir a uma facção, apresentando-se para o leitor como "a serviço do Brasil". Ora, como diz o lema do governo Lula, o Brasil é de todos, não apenas do que pensam como Folha, Estadão, Globo e Veja.
Essa ambiguidade entre o slogan e a linha editorial da Folha traz prejuízos não a uma candidatura, mas à democracia. É em nome da demcracia que o modelo liberal de imprensa, que neste ano recebeu seu atesto de falência no Brasil, precisa ser superado. Ela distorce completamente o significa democrático da imprensa, de serviço que informa corretamente o leitor. Dia desses li uma jornalista argumentando a um leitor indignado com a distorção do noticiário que qualquer jornalista sabe que não falará mal do Aécio no Estado de Minas nem da Igreja Universal no Hoje em Dia. Ela tem razão: os jornalistas aprendem na prática a se curvar aos interesses da empresa, em detrimento do exercício profissional digno. Quem perde com isso é o leitor, é a informação. Da informação proibida à informação distorcida o passo é curto.
É melhor que o jornalista da Folha, por exemplo, saiba que naquele jornal não se fala mal dos tucanos, nem se fala bem dos petistas, mas também não se publicam mentiras. Melhor e mais democrático: o leitor confiará na informação e não será enganado, ainda que ao escolher a publicação que vai ler, saiba que está escolhendo um ponto de vista.
O governo Lula encerra um período histórico do país, um período em que prosperou e morreu a imprensa liberal, assim como na ditadura prosperou e morreu a imprensa nanica. A "grande" imprensa declarou e demonstrou na prática que não é independente e com isso matou o mito da imparcialidade jornalística. É preciso agora que as facções políticas às quais ela se opõe, e que pela terceira eleição consecutiva demonstraram contar com a preferência da maioria do eleitorado, possa também se expressar. Que floresçam, pois, cem Folhas!

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

O segundo turno é uma eleição para a minoria

No artigo O movimento dos votos, publicado no último domingo, 24/10, o sociólogo Marcos Coimbra, presidente do Vox Populi, analisa a transferência de votos do primeiro para o segundo turno da eleição presidencial. O que ele diz de mais relevante é o que eu escrevi no portal Minas Livre há duas semanas: o segundo turno é "outra eleição" para os eleitores da Marina, que precisam fazer uma nova escolha. As pesquisas indicam que o voto nos candidatos está consolidado, a transferência é mínima e equivalente. Também não há mudanças significativas em relação a votos nulos, brancos e abstenção. Assim, diz o sociólogo, decisivos mesmo são os eleitores de Marina – e eles deverão dar a vitória a Dilma.
Coimbra e o Vox estão em quarentena, porque erraram feio, ao prever a vitória da candidata do PT no primeiro turno; agora precisam acertar, e bem, no segundo. Independentemente das suas conclusões, porém, a análise do sociólogo é interessante. Se está certa, isto significa que a votação poderia ficar restrita aos eleitores de Marina! Já que os eleitores de Dilma (47%) e Serra (33%) não mudam seu voto, é exclusivamente aos eleitores de Marina que os candidatos têm de se dirigir. O segundo turno torna 20% do eleitorado mais importantes do que 80%, a minoria vale mais que a maioria! No entanto, durante quatro semanas, os candidatos repetem toda a campanha e falam para todo o eleitorado, inutilmente.
Para que, afinal, o segundo turno? Nas quatro eleições presidenciais do período populista (1945-1964), levava o candidato mais votado e ponto final. Juscelino Kubitschek, por exemplo, foi eleito presidente com os votos de um terço do eleitorado. O método provocava questionamentos sobre a legitimidade do presidente, pois "quem sabe" a maioria não preferisse o que ficou em segundo lugar? Ou terceiro? Daí o segundo turno, incluído no artigo 77 da Constituição de 1988. Seu objetivo é que o eleito obtenha a preferência inquestionável da maioria do eleitorado.
Se o propósito é legítimo, o método é questionável – seja o prazo para a segunda votação, seja a forma como ela ocorre e até mesmo a sua existência. Sim, porque, o fato de não haver segundo turno não significa que não houvesse a acomodação de votos que ocorre nele. Haveria o chamado "voto útil": se meu candidato predileto não vai ganhar e pode ganhar aquele que eu rejeito, eu cogitaria na possibilidade de votar em outro que eu rejeito menos, mas tem chance de ganhar. Acontece assim nos países em que não existe segundo turno.
Há uma tendência geral, que já se verifica também no Brasil há algumas eleições, de polarização entre dois candidatos, ou duas forças políticas. Não seria exagero dizer que é a própria polarização da luta de classes: capitalistas X trabalhadores – embora a democracia burguesa fuja dessa ideia como o diabo da cruz. Apenas a primeira eleição direta do atual período histórico escapou disso.
Em 1989 houve 22 candidatos e pelo menos meia dúzia deles disputavam a preferência do eleitorado, alternando lugares na gangorra das pesquisas. No fim, três se destacaram: Collor, Lula e Brizola. No segundo turno as esquerdas se uniram em torno de Lula e as direitas em torno de Collor, dividindo o eleitorado praticamente em duas partes iguais. De lá para cá, isso acontece já no primeiro turno, com a polarização dos partidos mais fortes: o PT, por sua trajetória e raízes sociais, o PSDB como herdeiro do plano de estabilização econômica e das esperanças da direita.
A experiência de seis eleições transformou o segundo turno de uma panaceia democrática em uma eleição de vale tudo. É natural que isso tenha acontecido. Em 1988, quando a Constituição foi escrita, buscávamos fórmulas ideais para a solução dos problemas brasileiros, sufocados por 21 anos de ditadura. O segundo turno era uma dessas fórmulas ideais difíceis de serem contestadas, a não ser pela experiência. É o que temos agora, depois de mais 21 anos e seis eleições.
A pesquisa da Vox analisada por Coimbra ilumina com números a situação. Convenhamos: que ganho tivemos nessas quatro semanas, senão baixarias e tentativas de ganhar a qualquer custo (por parte do candidato oposicionista)? Deixando de lado os métodos protofascistas da direita brasileira, o segundo turno favorece baixarias, pois concentra acusações mútuas e cria o clima do antagonismo entre o bem e o mal. No primeiro turno, com outras forças em disputa, esses conflitos se dispersam, em parte.
No segundo turno, é preciso conquistar os votos de uma parcela transformada em decisiva. Que parcela é essa? O que ela pensa? O que quer? De repente, uma minoria radical se torna fiel da balança. Para conquistá-la e os votos necessários à sua eleição, o candidato promete o que não está no seu programa, faz acordos que desfiguram seu futuro governo. É isto democrático? É democrático submeter a maioria à minoria? A legitimidade da maioria (formada, afinal, com adesão de uma minoria talvez pouco convicta) vale o festival de baixarias que o segundo turno concentra? Sem falar no alto custo da própria campanha.
Não há fórmulas representativas infalíveis, é a experiência que deve dizer qual é melhor, qual é a pior. Ou: qual é menos pior. Há apenas um princípio democrático elementar: todos são iguais. É dele que a democracia deve procurar se aproximar, ampliando consultas, criando mecanismos de participação, inclusive aqui, na web. Quando a Constituição de 88 foi elaborada, a internet e seu potencial democratizante não existiam.
O segundo turno precisa ser revisto. Talvez o erro esteja na existência de uma nova e extenuantemente longa campanha eleitoral – apurado o resultado, a nova votação poderia ser feita uma semana depois da primeira. Talvez seja um defeito de origem do sistema presidencialista, uma vez que no parlamentarismo o partido vitorioso passa, em seguida, a compor com outros a sua maioria para governar. O fato é que o poder conferido à minoria para decidir pela maioria não pode ser considerado um critério democrático. O festival de baixarias a que assistimos nas últimas semanas tampouco contribuiu para o avanço democrático do país.

sábado, 23 de outubro de 2010

Um país militarizado

República proclamada por um general (monarquista!), o Brasil tem essa essa tradição de meter militares em tudo. Depois dos dois primeiros presidentes generais, os civis assumiram o poder durante quase quarenta anos, mas os militares continuaram promovendo levantes, até que chegaram ao poder novamente, com a Revolução de 30 e Getúlio Vargas. Curiosamente, os militares eram então progressistas, se chamamos assim aqueles que se preocupam com o todo – e não só com uma classe, como as oligarquias que governaram entre 1894 e 1930 –, com o país, com o povo. Em 1945, os militarem voltaram a depor o presidente, mas empossaram outro civil no poder; inaugurada nova ordem política, com constituinte e eleições periódicas, os militares passaram mais 18 anos promovendo levantes, até um novo golpe, em 1964. Desta vez, não entregaram o poder a civis, mas permaneceram nele durante 21 anos. Vivemos hoje, depois de nova devolução do governo aos civis, nova Constituição e sucessivos presidentes eleitos, um inusitado período histórico em que os militares abandonaram política e ideologia, para se limitarem às suas funções constitucionais. Na atual campanha eleitoral, houve uma tentativa de um dos lados em disputa politizarem novamente as forças armadas, mas tal atitude, aparentemente, não prosperou. Não obstante, a vida brasileira é muito mais militarizada do que deveria ser, a começar pela existência de polícias militares (!) em todas as unidades da Federação. Também a polícia civial tem um poder arbitrário impressionante. Passados 25 anos do fim da ditadura militar, as polícias continuam se comportando como inimigas da população, continuam tratando os cidadãos como se fossem inferiores e elas, uma casta superior, quando na verdade elas são servidores da sociedade, existem para prestar serviços (de segurança) e são remuneradas pelo imposto recolhido pelos cidadãos.

O que polícia tem a ver com motoristas e carros?

Umas das coisas que eu não entendo neste país é por que o licenciamento de veículos e motoristas está subordinado à polícia. Dirigir carro exige conhecimento menor do que, digamos, construir um edifício ou tratar doentes. Imagina se médicos e engenheiros, para obter seu diploma profissional, tivessem de se submeter a um exame feito por dois policiais pouco amistosos. Escolas de motoristas deveriam estar submetidas ao Ministério da Educação – ou às secretarias estaduais e municipais de educação. Se são boas escolas, têm licença, funcionam, podem emitir diplomas e são responsáveis pelos alunos que formam – esta é a lógica em qualquer aprendizado. O que a polícia tem a ver com isso? Nada. Da mesma forma, o licenciamento dos veículos, deveria ser feito por órgão público específico, sem ligação com a polícia, que também não entende de motores e outras tecnologias. Como em tudo, a burocracia só favorece a corrupção; é um atentado à cidadania, essa coisa que o brasileiro praticamente desconhece. Se no meio tem o poder da polícia, então, a corrupção se agrava e leva a outros crimes, mais violentos.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Os independentes e a derrota do protofascismo brasileiro

Daqui a alguns anos, poderemos olhar para trás e dizer: como o Brasil melhorou! Como este país avançou! E a gente, que se acostuma com o que é bom, talvez nem tenha se dado conta disso enquanto acontecia, mas quem viveu os anos sofridos da ditadura militar, as incertezas do governo Sarney, os sobressaltos do governo Collor e as decepções do governo FHC, saberá reconhecer a diferença. No entanto, recordaremos, houve um momento em que este avanço do Brasil para se tornar uma grande nação democrática correu risco. Foi quando a direita, enfraquecida por falta de apoio popular, apelou para campanhas difamatórias e, com apoio da velha mídia, que ela controlava, flertou com o fascismo.

A derrota dos protofascistas brasileiros (conforme os define a filósofa Marilena Chauí) personificados na candidatura de José Serra à Presidência da República, em 2010, se deveu à bravura de uma parcela considerável de políticos de esquerda, mas principalmente à mobilização cívica das classes populares. A maioria da população soube distinguir interesses e ideologias, soube resistir à campanha insidiosa da Rede Globo, da revista Veja, dos jornais Folha, Estadão e Globo, soube desprezar a opinião de jornalistas e artistas cooptados pelo embrião fascista da direita brasileira. Graças ao discernimento da maioria da população brasileira, a serpente morreu no ovo. A democracia recebeu seu batismo de foto e venceu, ao contrário do que tinha acontecido em 1964. Uma vitória para se orgulhar.

Antigos líderes políticos e militantes "independentes" talvez lamentem sua decisão. Quem sabe alguns deles reconheçam seu equívoco? A neutralidade é um erro político clássico na História. Suas consequências podem ser castatróficas. Foi a indecisão de parte da esquerda que permitiu o avanço do nazi-fascismo, no começo do século XX. Felizmente, os "independentes" no Brasil, em 2010, estreavam na política, eram incapazes de imobilizar grande parcela da população. Em função da sua atitude, nunca foram além daquele resultado eleitoral no primeiro turno, que quase atingiu 20%.

Foi esse resultado surpreendente talvez o responsável pela posição equivocada assumida por eles. Julgaram-se mais fortes do que eram, consideraram-se mais importantes do que seus eleitores. Sim, porque qualquer partido tem responsabilidade sobre seus eleitores, e essa responsabilidade se traduz em dizer a eles qual as duas forças restantes em disputa ele prefere. Porque a disputa se dará, querendo ou não os derrotados. Seus eleitores votarão novamente e escolherão um candidato. Um dos dois candidatos será eleito. O partido derrotado no primeiro turno que se compromete no segundo turno está indicando um caminho ao seu eleitor, e poderá ser cobrado por isso depois, seja errando, seja acertando na escolha.

O partido "independente" está dizendo ao leitor que tanto faz um candidato ou outro, que o único que merece o voto é ele, que seu futuro será o mesmo, seja com um seja com outro. E isso não é verdade. É raro o momento na história em que tanto faz. Até durante a ditadura, havia escolha entre Arena e MDB. Mesmo entre dois partidos de direita há um pior e um menos pior. O que dizer então quando a disputa se dá nitidamente entre um partido cujo governo recebe aprovação de 81% da população e outro que representa as elites, especialmente as elites que controlam a comunicação? Como dizer que não faz diferença a eleição de uma candidata que faz campanha limpa, apresentando resultados do governo e propostas para o futuro, ou de um candidato que faz promessas que não cumprirá e, principalmente, apela para métodos protofascistas?

Faz diferença, inclusive para os "independentes". Eles verão isso e terão motivos fortes para se arrepender. Felizmente, graças ao discernimento da maioria da população, à bravura dos políticos de esquerda e à mobilização civica de um exército de militantes – dos quais uma das principais armas contra a velha mídia é esta aqui, a nova mídia, democrática e acessível a todos –, graças, enfim, àqueles que souberam escolher o lado certo, os "independentes" não terão de se arrepender do pior: terem colaborado para a ascensão do fascismo.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

21 anos de eleições presidenciais: o débito democrático

O governo Lula encerra um ciclo de 21 anos de governos civis comandados por presidentes eleitos diretamente. É o mesmo tempo que durou a ditadura militar. Entre os dois ciclos, uma transição de cinco anos: o governo Sarney – civil, porém, eleito indiretamente, como os presidentes militares; compromissado com o povo, porém homem de confiança do regime.

Indepementemente do resultado da eleição do próximo dia 31, o fim do governo Lula fecha um ciclo em que o Brasil viveu um período rico de experiência democrática. É salutar que tenhamos mais um(a) presidente eleito(a) diretamente. Acima de tudo, devemos desejar fervorosamente que ele (ela) termine seu mandato e que um novo (uma nova) presidente seja eleito(a) em 2014.

Não é pouco. O Brasil entrou no século XX pelas mãos de uma revolução (1930), seguida de uma ditadura (1937). Os primeiros progressos sociais significativos deste país foram doados por um governo autoritário. A experiência democrática que se seguiu, a chamada "república populista", durou só 19 anos (1945-1964), e elegeu apenas quatro presidentes, dos quais dois não terminaram seu mandato – um suicidou, outro renunciou. Acrescentemos a eles o presidente João Goulart, vice-presidente que assuntiu a presidência na renúncia de Jânio Quadros, e que foi deposto pelo golpe militar de 1964, e constataremos facilmente que aquela experiência não foi exitosa.

A experiência atual resistiu à eleição e reeleição de um presidente de esquerda, filiado a um partido trabalhista. Também não é pouca coisa. Repetindo: o primeiro presidente trabalhista do Brasil, Getúlio Vargas, suicidou, em 1954, para não ser deposto. O segundo, Goulart, foi deposto.

Os 21 anos da ditadura militar são uma ferida que até hoje não cicatrizou. Seus efeitos nefastos perduram. Experimentar 26 anos de governos civis, 21 anos de governos eleitos diretamente, eleger seis presidentes sucessivamente, é um feito a ser comemorado. Sobretudo, é um motivo de orgulho para mais de 135 milhões de eleitores que este ano decidiram nas urnas o futuro do país. A República Velha (1889-1930) foi mais longeva e elegeu 11 presidentes, mas naquele período, o povo não votava.

A continuidade da ordem democrática é fundamental para o progresso do país. A sucessão de governos sem interrupção dessa ordem demonstra que a solução democrática prevalece, que vamos aprendendo e seguindo em frente. Podemos dizer que nesses 26 anos tivemos presidentes de todos partidos importantes, daqueles que sobreviveram à ditadura até aquele que representou a maior renovação da política brasileira em todos os tempos. Apenas a extrema esquerda, por dizer assim, os partidos socialistas, comunistas, marxistas e revolucionários não lograram conquistar a presidência pelo voto direito. (Boa parte deles não se importa muito com eleições.)

Primeiro, foi o PMDB, de Sarney, associado ao PFL (ex-PDS, ex-Arena, os herdeiros "democráticos" da ditadura militar, hoje denominado DEM). Depois de dois anos instáveis, o governo do PSDB, que começou com Itamar, em 1992, quando o presidente Collor foi impedido. Já com o presidente FHC, os tucanos permaneceram mais oito anos no governo, graças ao Plano Real, e sempre coligado com o PFL, cujos filiados em muitos casos estavam no poder desde 1964, somando nada menos do que 38 anos sem soltar o osso, um recorde mundial, quem sabe. Em 2002 foi, enfim, a vez ao PT chegar ao poder, com o presidente Lula; com a reeleição em 2006, passaram-se oito anos.

E agora? O que é que o Brasil vai experimentar? Experimentamos sucessivos planos econômicos até um que conseguiu controlar a inflação. Experimentamos governos de todas as matizes em busca da realização das aspirações que toda uma geração de brasileiros proclamou nas ruas, em 1984, na campanha Direjas já!, o maior movimento cívico da história do país. Governado por todos os partidos, que balanço podemos fazer do Brasil hoje? Quanto foi alcançado daquela democracia sonhada coletivamente em praça pública nos extertores da ditadura?

Talvez a gente possa começar perguntando a nós mesmos, depois dessa longa experiência, o que é democracia. Com o que é que sonhávamos quando reivindicamos, aos milhões, juntos, eleger o presidente pelo voto direto outra vez? Se democracia é eleger diretamente o presidente, isso nós já temos. Se é mais que isso, certamente constataremos que os presidentes eleitos em mais de uma década estão em débito com os nossos sonhos. Neste caso, pagar este débito é a principal tarefa do(a) presidente eleito(a).

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Quando é que as coisas vão melhorar?

Os aeroportos vão melhorar quando o presidente viajar de avião de carreira.
O trânsito vai melhorar quando o governador parar de andar de helicóptero.
Os passeios vão melhorar quando o prefeito andar na rua.
O transporte público vai melhorar quando os desembargadores não tiverem carros oficiais.
A justiça vai ficar rápida quando os banqueiros dependerem de defensores públicos.
A saúde vai melhorar quando os deputados forem atendidos pelo SUS.
A educação vai melhorar quando os filhos dos empresários estudarem em escolas públicas.
Do Blog da Cidadania

Bullying eleitoral


Estou impressionado com um caso relatado pelo amigo Arnóbio Rocha, tuiteiro com quem dividi os corredores do hospital em que minha filha Victória e Letícia, uma das filhas dele, estiveram internadas ao mesmo tempo há alguns meses.

Esse caso dá uma idéia das barbaridades que estão sendo praticados nesta campanha eleitoral, que pode passar à história como uma das mais sujas que este país já viu depois da redemocratização.

Vale relatar que tudo se deve ao candidato da mídia, bem como a própria, não estarem aceitando limites sobre o que usar para vencer a eleição presidencial.

Arnóbio relata, via Twitter, bullying que uma de suas filhas sofreu na escola em que estuda devido aos seus pais serem eleitores declarados de Dilma Rousseff.

O caso me parece extremamente grave. Inaceitável numa democracia. Este é o primeiro relato de dois que pretendo fazer hoje sobre o clima que o candidato José Serra, o jornal Folha de São Paulo, a Rede Globo, o Estadão e a revista Veja, entre outros, estão impondo ao país.

Arnóbio começa seu relato explicando o que é bullying: “Termo em inglês utilizado para descrever atos de violência física ou psicológica, intencionais e repetidos, praticados por um indivíduo (bully – «tiranete» ou «valentão») ou grupo de indivíduos com o objetivo de intimidar ou agredir outro indivíduo (ou grupo de indivíduos) incapaz(es) de se defender”.

Segundo Arnóbio, sua filha de 9 anos estuda em uma escola cristã de classe média de São Paulo e foi vítima de “bulliyng pesado” por “defender Dilma”. Teria sido importunada por coleguinhas cujos pais votaram em Serra, que debochavam dela alegando que o tucano teria “vencido” o primeiro turno e Dilma, “perdido”.

A garota, segundo o relato, teria revidado dizendo que havia “mais eleição” pela frente – bela resposta para uma criança de nove anos. Todavia, naquele momento os coleguinhas começaram a gritar “Dilma Assassina”, e que ela “foi presa”, que “roubava” e que “mata crianças”.

Agora a parte mais revoltante e assustadora: a filha de Arnóbio diz ter sido caçada, encurralada e recebido socos e pontapés, além de os agressores terem pisado na mochila dela enquanto gritavam insultos e deboches.

Quando a mãe da menina foi buscá-la na escola, encontrou a filha aos prantos tentando relatar a agressão que sofrera.

Ainda segundo meu companheiro de hospital – alguém que tem a filha primogênita, de doze anos, sofrendo de leucemia -, este é o perfil dos pais dos alunos da tal escola: curso superior e salários, em média, de R$12 a 15 mil.

Arnóbio ainda assevera que “Nem em 1989 Collor ousou pregar o ódio de forma tão aberta” e que “Transformaram as eleições num inferno, em São Paulo”. E conclui dizendo que “não dá mais para ficar calado”.

Na classe da vítima dessa nova forma de bullying inventada pela campanha de Serra, o “bullying eleitoral”, dos 21 alunos 4 dizem que os pais votam em Dilma e todos estão sendo vítimas dos demais.

Arnóbio não quer revelar o nome da escola, no que julgo que está certo. Mas só até o ponto em que essa instituição tomar providências. Se tal não ocorrer, penso que ele deve tomar uma atitude. Não denunciar essa barbaridade equivale a aceitar ter a sua liberdade de expressão e de opinião desrespeitada.

Aguardemos…




Cristina Alarcón Chamarelli e Goossens Tendência: A favor Comentário:
Tenho uma filha de 14 anos, vítima de bullying desde os 8; temos trabalhado muito para reverter este quadro e agora está melhorando. É um tipo de bullying devido ao fato de ela ser TDHA,nunca conseguir um grupo para fazer um trabalho, ter notas ruins. Uma coisa dela que está sendo tratada com profissionais adequados e que ela precisa aprender a se impor e a escola tem que ensinar que diferentes não são ruins... Já sofremos muito com isso, mas temos feito o possível... Agora neste caso específico é um absurdo total, crianças não discriminam outras se não forem ensinadas a fazer isto. Ainda mais aos nove anos: as informações que eles passam erroneamente sobre a Dilma foi, claramente, plantada nas cabecinhas deles... Acabei de perguntar à minha filha qual era a opinião da turma dela sobre a eleição. Ela estuda em uma escola pública de excelência aqui no Rio, onde se entra por sorteio no CA, ou concurso na 5ª série. sabem qual foi a resposta? Estamos estudando isto em história e geografia, mas ninguém na turma declarou o voto dos pais... Quanta diferença! Uma escola que mescla uma diversidade cultural, religiosa, financeira e racial, formando cidadãos conscientes sem necessidade de provocar embates, discutindo política como mais uma das coisas que eles precisam aprender... Nesta hora sinto muito orgulho das escolhas que fiz para minha família e orgulho também da minha cidade. Em nenhum momento vi nada absurdo acontecer por aqui. Muitos marinaram, meu vizinho debaixo tem uma enorme bandeira do Serra e eu uma da da Dilma em cima, mas não vejo o ódio que me dizem haver em SP. Espero que este clima democrático persista no 2º turno. Eu vivi 1989, e sei como é difícil ser olhada como alien...



veranis
Tendência: A favor
Comentário:
Aconteceu algo similar com minha neta de 8 anos. Estuda também numa escola de classe média, católica. Felizmente não houve agressão física, nem constrangimentos maiores. Mas segundo ela, todos ficaram meio que horrorizados por nossa família votar no PT. Algo muito ruim está acontecendo em São Paulo. Está me lembrando muito a Marcha com Deus pela Liberdade na década de 60.


Gislene
Tendência: A favor
Comentário:
Meu filho, que estuda em determinado cursinho bem conceituado (e bem caro) de São Paulo está sofrendo algo semelhante... E o que é pior, muitos professores em sala de aula fazem campanha descarada para Serra, contando mentiras aos alunos... e impedindo que se faça o debate com opiniões divergentes. Depois, falam que a censura vem do governo Lula... É uma guerra suja, que precisa ser denunciada sob pena de nossas crianças e adolescentes começarem a achar que não é possível ter opinião própria a respeito dos fatos e dos acontecimentos.

Dan Moche Schneider
Tendência: A favor
Comentário:
Prezado autor, Gostaria de recomendar ao seu amigo Arnóbio que, independentemente dos procedimentos que a escola venha a tomar, ele constitua advogado, faça um boletim de ocorrência e faça valer, com firmeza e determinação, todos os direitos que são inerentes à uma criança, assegurados pelo ECA e outras Leis. Que como pai, se posicione e ensine a sua filha, e às outras crianças intimidadas, a partir desse episódio lamentável, a se posicionar e a buscar os seus direitos. Não releve. Não deixe passar em brancas nuvens. Não deixe apenas para a escola tomar providências que, experiência própria, tende a minimizar fatos desse tipo e por "panos quentes".

ciça menezes
Tendência: A favor
Comentário:
no blog original, estão muitos comentarios que relatam a mesma estória. fiquei comovida, pq bem si que é por isto q não se pode andar em qq lugar, mesmo aqui no rio, fazendo camapnha pra dilma. ouvi um comentario meio mal educado de alguem q havia me perguntado em quem eu votara- um colega de trabalho. aqui no rio. há eleitores de marina q tem este perfil da direita agressiva - são direita mas dizem q são a real esquerda. vão anular ou até votar serra. me preocupam...

monica
Tendência: A favor
Comentário:
Minha filha, que estudo em um cursinho, comenta sobre o discurso preconceituoso e odioso contra Lula e Dilma feito por alguns professores. Sem contar o espanto das pessoas quando ela fala que os pais e ela votam no PT.

Sonia
Tendência: A favor
Comentário:
Qualquer morador de SP ou região metropolitana, que declare abertamente seu voto em Dilma, sabe o que o espera. Tenho 44 anos e jamai vi uma companha eleitoral em que tanto ódio fosse instilado e moro em SBC, "reduto" do PT. Em meu trabalho, quando o assunto é eleição, só tenho duas alternativas: Ou saio de perto, calada, ou me torno alvo de uma raivosa saraivada das mais mentirosas e baixas agressões. Devemos manter nossos olhos bem abertos, pois paira sobre nós o risco de um retrocesso incalculável à democracia.

Antonio
Tendência: A favor
Comentário:
Eu acredito que a escola deve ter seu nome divulgado, sim.Esta instituição é co-responsável pela educação e civilização dos seus alunos. É possível que ela tenha conhecimento destes atos, pois o sistema de vigilância destas escolas é muito rigoroso, é difícil não saber do que está ocorrendo internamente. Ou ela não quer e pode,( é complacente) ou quer e não pode ( é impotente) ou não quer e não pode( é complacente e impotente) ou quer e pode ( porque não o faz?).

Antonio jose de Brito
Tendência: A favor
Comentário:
Meu caro, sou professor universitário em uma das importantes universidades privadas do estado de São Paulo. Só que ro testemunhar a existência desse ódio entre os jovens de 18 a 22 anos, com relação à Dilma e àqueles que a apoiaram. Os argumentos de assassina, ladra e guerrilheira são os mesmos. O que me chamou a atenção é o ódio com que expressam essas palavras. Inclusive, alguns, que mal ouviram falar no PT, aparecem com o discurso "eu odeio o PT". Chamo a atenação que muitos desses sentimentos também estão presentes entre professores, quando não no comando da Universidade e, o que é pior, entre alunos PROUNI, lamentavelmente. Mas, a grande maioria consiste nos filhos da elite paulistana.

Mario
Tendência: A favor
Comentário:
Sou professor de história em uma escola particular de sp, não declaro meu voto para os alunos e no dia seguinte à eleição um aluno (o único negro da sala, se isso for relevante), que votou pela primeira vez, veio me procurar dizendo que foi atacado verbalmente pelos colegas por declarar voto à Dilma. Agora fiquem felizes por vivermos em um país livre.

· 6 dias atrás
Amigos, quero compartilhar uma experiência vivida por minha filha.
Foi no ano de 2006, ela estudava na 8ª série numa escola particular no litoral Sul Paulista (Mongaguá). No meio da aula, "do nada", a professora de Língua Portuguesa começou a falar mal do Lula e dos eleitores de Lula. Entre outras "pérolas" ela afirmou o seguinte: "Não conheço nenhum eleitor do Lula, afinal não convivo com vagabundos".
Minha filha, chocada, contou a história em casa e não tive dúvidas: na manhã seguinte estava na porta da direção para exigir a retratação da professora, além de apresentar para ela um eleitor de Lula, um outro colega de profissão... "tão vagabundo quanto a senhora", assim falei.
Isso foi numa cidade de 40.000 habitantes, onde as pessoas se conhecem com extrema facilidade. E neste caso, tanto eu como minha esposa, professores a mais de 20 anos, somos (modestamente) bem conhecidos por nossas convicções políticas.
Nunca imaginaria que fatos ainda mais absurdos estivessem por vir... Total solidariedade à família da criança e à criança também.
Não se pode subestimar o delírio autoritário da direita.

Moro em BH e meus filhos estudam numa escola católica de classe média alta. HOJE o meu filho de 8 anos me contou que ao relatar aos amigos que eu (suam mãe) havia votado na Dilma, que os colegas riam e gritavam: - Sua mãe votou numa ladra!!!! Ela é ladra!!!! Ela é ladra!!!!
Ensinei-o a dizer a eles que eles não sabem o que estão falando mas....


Conversei ao telefone com pessoa amiga de São Paulo. Relatou-me um churrasco entre amigos, de longa data, na casa de um dos integrantes do grupo. Durante todo o tempo em que a pessoa ficou na confraternização, ela foi humilhada com o menosprezo das costas viradas das tradicionais rodinhas que se formam e se alteram durante tais convescotes. "Essa aí é louca! Vota na Dilma. Que tristeza"". Frases desse tipo, ditas e repetidas vezes, com a consequente virada de costas e mudança de local em que estava a ofendida. Sem direito de réplica. Pelo jeito, o almoço deve ter sido indigesto. E não é um relato incomum. Quando o Paulo Henrique Amorim, em tom de chacota, diz ser a "... elite paulista, separatista e retrógada...", alguns comentam como exagero do PHA. Parece que não é. Há bullying pra todo gosto.

Eu, jovem de 27 anos, sofri bullyng num cursinho preparatório para concursos entre dois jornalistas e uma psicóloga(os três estudantes que influenciaram os demais, inclusive com ajuda de uma professora declarada Serra) pois indiretamente declarei apoio ao governo Lula, eles me isolaram e fofocavam sobre mim nos banheiros e riam quando eu passava nos corredores do cursinho. Os que se dizem defensores da Democracia apoiados pelas idéias do PSDB e PFL são os primeiros a suprimirem e recriminarem a nossa maniefestação de pensamento contrária. Eu sei me defender e uma criança? Com certeza não!
Precisamos conscientizar a Imprensa Brasileira sobre seus estragos em nossas vidas, em nossa dignidade humana o quanto antes. Há muitas pessoas irresponsáveis no Brasil.

Meu neto de 9 anos, estuda num excelente Colégio em nossa cidade. Jacareí-SP. A direção vota no PT desde sempre, mas os pais dos coleguinhas dele, todos das classes A e B da cidade, claro, são TUCANALHAS desde sempre. Ele passou pela mesma situação, em sala de aula. O pior é que a professora (assim mesmo, com "p" minúsculo), entrou na corda e comentou tudo que disse ter lido na imprensa golpista, como se fossem verdades absolutas. Meu neto, participa ativamente comigo e com a mãe da política do meu partido, inclusive nos acompanhando quando quer, em reuniões do Diretório, caminhadas, bandeiraço, etc. Podem acessar meu orkut e verão muitas fotos dele lá, no álbum "PT Criança"!. Claro que a consciência política dele é diferente da dos coleguinhas. Felizmente, lá não chegaram às vias de fato como no caso relatado belo companheiro blogueiro, mas não deixei passar batido. Fui à escola, reuní a professora, a Orientadora, o Coordenador e dei uma aula de história. Entre outras coisas, disse a eles que a História do Brasil é cheia de mentiras. Tenho 60 anos, e aprendí em meus anos de estudante, que os Bandeirantes eram heróis, que desbravaram o sertão. Hoje sei que não passavam de dizimadores de índios, na busca do tão sonhado ouro do nosso rincão! Disse também, que graças à Dilma, hoje os pais e professores podiam dizer livremente estas barbaridades aos seus filhos e alunos e nada lhes acontecia, a não ser dias piores, para todos, inclusive para aqueles que votam no PT. Contei a eles, que na época da Ditadura, a FALHA de São Paulo emprestava seus carros para a repressão, e eu, que trabalhava no City Bank, naesquina da Av. São João com Av. Ipiranga, saí à rua para jogar bolinha de gude na linha do bonde para derrubar a cavalaria que covardemente avançava sobre estudantes e manifestantes, que joguei miguelito (quem é da época sabe) no asfalto para furar os pneus dos carros do DOI-CODI e, fui pintada de azul pelo Brucutu que vinha l´go atráz da cavalaria, tendo me escondido no Bar do Jeca, que ficva namesma esquina. Fui salva pela abertura da incisão de uma cirurgia que havia feito na tireóide um mês antes, e fui pedir ajuda a umcarro que julgava ser da Folha... Ledo engano. Era da repressão, descaracterizado,e tive que dizer que saí em busca de socorro para minha situação de emergência, e "por aacaso", ao atravessar a multidão, fui pintada de azul. Me colocaram numa Veraneio verde, melevaram até em casa (minha mãe era enfermeira e sabendo a filha que tinha, quando viu o carro em nossa porta, quase põe tudo a perder...) e de lá fomos até a Santa Casa de São Paulo, onde fui atendida e eles resolveram dispensar aquela menina (tinha 17/18 anos), que não representava "nenhum perigo"! Por isso, fiz um barraco com os "educadores" da escola, para que eles conheçam um pouco mais da história - por quem a viveu na pele - antes de coibir abusos de inocentes crianças que só repetem discursos dos pais! Funcionou. A escola pediu aos alunos e professores, que deixassem as discussões sobre preferências eleitorais para as aulas de história, onde no momento eles estão aprendendo assuntos mais "amenos". rsrsrs

Boa Tarde Eduardo,__tenho um filho de 10 anos que estuda em colégio católico em Juiz de Fora. Nos ultimos dias tenho notado que ele não quer colocar o adesivo da Dilma no peito, conversando com ele, descobri que seus amiguinhos estão lhe chamando de burro, que a Dilma é assassina de criancinhas, assaltante de banco, etc...__Sinceramente estou com medo, fico imaginando o que nossa elite vai fazer caso o Serra seja eleito.__

Moro no interior do Paraná, numa cidade de 300.000 habitantes. Minha filha tem 13 anos e vem sofrendo "pressão" das coleguinhas por conta do nosso voto (eu e meu marido) em Dilma.
Somos de classe média (meu marido é servidor federal, eu "concurseira" ainda...), a maioria das crianças também pertencem à classe média, algumas com um pouco mais de recursos.
Na sala dela (7ª) da escola apenas ela e a filha da coordenadora da escola tem os pais que votam em Dilma. Ah, claro! Alguns professores tbem. Essa semana cheguei a cogitar uma 'visitinha" na escola pra fazer um alerta a respeito disso e pedir que o assunto Eleição não fosse mais levado pra sala de aula (coisa que tinha ocorrido).
Minha filha, pela idade, não vota ainda, então acho que já que a situação ficou tão delicada prudência não faz mal a ninguém. Deixei a semana correr pra ver se esfriava e foi o que aconteceu...Adiei um pouco...
Ela já passou por isso na escola, balé e no curso que faz de "manequim" (coisas de adolescente)...Detalhe: no balé e escola as pessoas já pertencem há um certo tempo à classe média, mas o curso de "modelo" mistura bem, tem gente lá que dá pra ver que elevou seu padrão de vida há pouco tempo... E TODOS destestam a Dilma.
O discurso é o mesmo: ela é a favor do aborto, terrorista, o vice dela é "satanista" (este tem um plano de matá-la após sua posse e assim submeter o Brasil a um governo do coisa ruim) e por aí vai o festival de besteiras...
Minha filha ri, dá umas discutidinhas (tem um pavio um pouco curto), mas não curte fossa. Ela tava chegando em casa aborrecida, mas no decorrer da semana isso melhorou, então deixei passar pq acho importante ela dar conta de si mesma sozinha!
Mesmo assim pretendo conversar com a coordenadora da escola sobre o assunto.

Portanto, transformaram sim essas eleições num período de trevas!
Somos cristãos e estamos chocados com o q vem acontecendo!!!



'O cara': 'Sim, nós podemos'

Ao terminar seu governo, Lula passará a ocupar no imaginário nacional o seleto lugar reservado apenas a duas outras personalidades históricas: a princesa Isabel, libertadora dos escravos, e o presidente Getúlio Vargas, que elevou o trabalhador à condição de cidadão.

O grande feito de Lula não é uma obra, não é o sucesso num determinado setor, não é um grande feito. Não é o pré-sal, não é o PAC, não foi controlar a marolinha. Também não é a expansão do crédito, nem a expansão do consumo, nem a ascensão da classe D para a classe C.

O grande feito de Lula é o conjunto da obra, é não ter fracassado, ao contrário: ter governado melhor do que seu antecessores. Ele sabe disso, é bate nessa tecla há mais de um ano.

O grande feito de Lula é simbólico. É ter demonstrado que um ex-metalúrgico, um semianalfabeto, um retirante nordestino, um homem do povo, pode governar tão bem ou melhor do que os bacanas, os ricos, os doutores. Ao fazer isso, Lula promoveu a igualdade neste país, como só foi feito antes por Getúlio Vargas e pela princesa Isabel.

Isabel, como princesa regente, enquanto seu pai viajava pela Europa, assinou a lei que aboliu a escravidão, em 1888. Pagou com a queda da monarquia, num golpe militar, um ano e meio depois.

Os escravos libertos mantiveram-se como brasileiros de segunda categoria até a Revolução de 1930, que levou Getúlio ao poder.

Getúlio promoveu o trabalhador à condição de cidadão, criando a legislação trabalhista, o sistema de amparo ao trabalhador, o partido trabalhista (PTB), pelo qual se elegeu presidente, em 1950. Pagou com a própria vida.

Getúlio e Isabel eram da elite. O povo saiu da senzala, ganhou as ruas, ganhou o direito de votar, mas manteve uma gratidão reverenciosa aos seus benfeitores. Isabel se tornou uma santa, Getúlio, um mártir.

Lula é um trabalhador, veio do povo, fala como o povo, é igual o povo. Ao dar o exemplo de competência, Lula promoveu a democracia como nenhum presidente antes dele.

"Somos todos iguais, um trabalhador pode ser tão bom quanto um doutor", disse Lula, com seu exemplo. E enfatizou com palavras.

"Qualquer brasileiro pode governar, não é preciso ser rico, não é preciso ser doutor, não é preciso ser bacana", demonstrou Lula.

"Não somos inferiores, não precisamos mais chamar ninguém de 'doutor', nem abaixar a cabeça, submissos."

"O que o povo precisa é de ser tratado com respeito. O que o trabalhador precisa é de oportunidades para mostrar seu valor. O que o brasileiro precisa é de uma sociedade democrática."

Obama disse que Lula é "o cara". Lula disse ao povo: "sim, nós podemos". Este é o seu legado. Deixa o governo aclamado, sem golpe, vivo. Entra direto para a História.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Os jovens jornalistas e o mau jornalismo

Jornalismo é uma profissão de gente jovem. Todos do ramo sabem disso, mas a maioria que não é ignora. Como tudo na vida, não é assim por acaso: esta situação não pode ser um mal para o negócio jornalismo, ao contrário, podemos supor que é um bem, que de alguma forma a juventude dos jornalistas colabora para o êxito das empresas de comunicação. É assim desde que entrei na faculdade e os coleguinhas mais velhos comentavam: jornalista não para na reportagem, depois de alguns anos ou assume um cargo de chefia ou arranja emprego numa assessoria.

Tal previsão é broxante para o jovem atraído para o jornalismo justamente pelo desejo de fazer reportagem. A reportagem é o coração do jornalismo, é muito mais fácil ser editor, redator ou pauteiro. Jornais são feitos por repórteres, bons repórteres garantem bom jornalismo. São mais raros do que se imagina. Mas uma equipe bem treinada e experiente também aguenta as pontas. O problema é que não dá tempo; se o bom repórter logo desaparece, o bem treinado também não dura muito, o experiente nem chega a existir.

Por que é assim? Em primeiro lugar, porque os salários pagos pelas empresas aos repórteres, ao contrário do pensa o vulgo, são baixos – ou muito baixos, se considerarmos os salários pagos por assessorias e alguns órgãos públicos. Trabalha-se muito, os horários são malucos, mas isso não chega a prejudicar: nunca conheci um repórter que não gostasse do seu ritmo corrido que o leva a conhecer gente e lugares, levar o cotidiano sem rotina, viajar. Reclama-se, é verdade, mas ninguém larga o osso, exceto por insatisfação profissional.

A insatisfação profissional não vem só da má remuneração, razoável para um jovem, mas insuficiente à medida que a vida passa, as responsabilidades e despesas aumentam. Vem também da pauta ruim, da manipulação da informação pelos chefes e patrões, da impossibilidade de tratar de temas considerados relevantes e tocar pautas próprias. O treinamento do repórter é acelerado, em seis meses de redação já se fez de tudo, já se aprendeu tudo que se tinha pra aprender; um jornalista com cinco anos de reportagem é um veterano, e quando se chega nesse ponto, a gente quer mais do que simplesmente cumprir pautas imbecis e repetitivas.

O fato é que os baixos salários e a insatisfação com a qualidade da informação que se produz tira os melhores repórteres das ruas, justamente quando sua experiência possibilita que ele seja um profissional melhor. O resultado é o baixo nível do jornalismo. Não se pode dizer mesmo que isso desgoste patrões e políticos: jovens repórteres inexperientes são manipulados com mais facilidade, são mais submissos, se impressionam com o teatro permanente dos poderosos, que são, enfim, aqueles que estão todos os dias no noticiário.

Belo Horizonte: 113 anos de extinção gradativa dos espaços públicos

O antigo campo do América, na Avenida dos Andradas, acaba de virar shopping. Repete-se o que aconteceu há duas décadas com o antigo campo do Atlético, em Lourdes, que se transformou no Diamond Mall. Há mais tempo ainda, na década de 70, se não me engano, o América já havia perdido seu primeiro campo, o Alameda, que deu lugar ao supermercado Pão de Açúcar, depois Extra, em Santa Efigênia. Cidade dos espaços abertos, Belo Horizonte pode ter sua história resumida no processo de substituição de áras públicas por áreas privadas.

No dia 3 de outubro, a caminho da urna eleitoral, passei pelo campo do pequeno Inconfidência, clube modesto do bairro Concórdia. Cresci jogando futebol num campo semelhante, o do Pitangui, na Lagoinha. Fico pensando que futuro aguarda esses dois espaços públicos remanescentes da fundação da cidade. Não sei como surgiram, mas o certo é que isso aconteceu numa época em que o espaço não era escasso e cobiçado pela indústria da construção civil, como é hoje. O Pitangui ocupou área em torno de uma pedreira desativada. Acredito que outros campos de futebol, o principal lazer popular, tenham surgido de forma semelhante. O Inconfidência, hoje, está cercado de construções, como uma ilha. Construções horizontais, felizmente; a inexistência de edifícios no Concórdia é provavelmente a garantia de existência do clube.

O fato é que a expansão imobiliária se dá ocupando espaços vazios e substituindo construções horizontais por construções verticais. Atualmente, qualquer terreno vazio em Belo Horizonte corre risco de ser ocupado e qualquer casa corre o risco de ser derrubada para dar lugar a um arranha-céu. A ocupação espacial da capital mineira se aproxima de 100%, não escapam sequer os morros mais íngremes. Talvez chegaremos ao dia em que os últimos espaços vazios serão ruas e avenidas – lotadas de carros. (Os passeios já são ocupados por todo tipo de equipamento: lixeiras, postes, orelhões, caixas de correio, bancas de revista, mesas de bares, abrigos de ônibus, além de árvores, canteiros, carros, motos e lixo.)

Nos primeiros anos da sua existência, Belo Horizonte chamava atenção pelos grandes espaços. Uma cidade projetada, construída no nada, tinha de possuir muitos espaços vazios, mas o próprio projeto urbanístico previu avenidas e ruas largas, passeios amplos. O Parque Municipal, localizado bem no centro da cidade, era um espaço privilegiado, e a cidade tinha também muitas praças.

Passados 113 anos, Belo Horizonte viu desaparecerem, um a um, quase todos os seus espaços públicos. Com eles desapareceram as áreas verdes e o clima salubérrimo que fizeram a fama da "cidade jardim", os passarinhos, os pequenos animais. Só para lembrar, neste ano em que se comemora o centenário de nascimento do compositor Noel Rosa: o "Poeta da Vila" foi um dos muitos brasileiros – e até estrangeiros – que passaram temporadas em Belo Horizonte em busca de cura para a tuberculose e outras doenças.

Este sítio era, por natureza, um lugar especial, com altitude de 850 metros, temperaturas amenas, protegido pela Serra do Curral e cortado por inúmeros ribeirões e córregos. Por isso, e pela localização central no estado, foi escolhido para ser sede da nova capital de Minas Gerais, que a recém-nascida República decidiu construir.

A República foi proclamada em 1889, em 1891 os constituinte mineiros aprovaram a lei de mudança da capital, em 1893 a construção começou, em 1897 a Cidade de Minas – como foi inicialmente chamada – estava pronta para ser ocupada. Os republicanos queriam construir uma cidade moderna, totalmente diferente da colonial Ouro Preto, antiga capital do estado.

Iniciativa louvável, talvez, o projeto da nova capital foi um equívoco urbanístico que se perpetuou em novos erros até chegar à cidade cada vez menos habitável dos dias atuais, e totalmente descaracterizada em relação ao projeto original, muito mais ainda da sua natureza cheia de qualidades. O engenheiro Aarão Reis desenhou a planta da cidade ignorando topografia e hidrografia. Belo Horizonte ganhou ladeiras e perdeu cursos d'água, transformados em canais de esgotos a céu aberto, mais tarde capeados.

O planejamento de linhas retas e grandes quarteirões ficou restrito à área urbana, compreendida pela Avenida do Contorno, ainda hoje a região mais civilizada da cidade. Todo o restante – zonas suburbana e rural – foi deixado à própria sorte, sem ruas, sem luz, sem água, sem esgoto, sem transporte. Não à toa: a zona urbana foi prevista para os ricos, a suburbana para os pobres.

Construída por um engenheiro, Belo Horizonte continuaria sendo a cidade das construtoras. Elas foram redesenhando o espaço urbano, sem planejamento, seguindo interesses privados, alheias aos interesses coletivos, tendo os políticos sempre a seu serviço, como acontece ainda hoje. Nem mesmo a região nobre da cidade ficou livre dessa distorção: o Parque Municipal perdeu cerca de dois terços da sua área original, o enorme quarteirão do zoológico foi entregue ao Minas Tênis Clube, para citar dois exemplos. Hoje, além de acanhado para uma metrópole, o parque é cercado; a antiga área verde do Minas foi ocupada por prédios.

O único melhoramento realmente importante recebido pela cidade desde sua construção foi a Pampulha. Construída por Juscelino Kubitschek, nos anos 1940, foi um marco da arquitetura moderna brasileira e reunia as condições para se tornar a área de lazer por excelência da capital. Como tudo em Belo Horizonte, porém, degenerou: a lagoa virou um grande esgoto e, assoreada, perdeu grande parte da sua área, além dos peixes. Seu entorno foi ocupado por particulares, a estreita avenida que a contorna é inadequada ao trânsito, praticamente nada foi feito desde JK, a não ser um parque sobre o lixo jogado na lagoa.

A partir dos anos 70, a capital mineira passou por uma grande expansão que acabou de descaracterizá-la e lhe deu a inóspita conformação atual. Novos bairros fizeram desaparecer a zona rural do município, enquanto favelas e vilas prosperavam na zona suburbana e os edifícios substituíam as casas na zona urbana.

O principal parque da cidade, o Mangabeiras, uma bela área de floresta junto à Serra do Curral, é o retrato do descaso com o espaço público pela administração municipal: mal cuidado, isolado da cidade, vem sendo cercado por ocupações irregulares e corre os mesmos riscos que vitimaram o Parque Municipal. O Mangabeiras não possui trilhas nem passeios, os visitantes o percorrem usando as estradinhas usadas pelo inadequado ônibus interno.

Pior do que o descaso e a omissão diante do gradativo desaparecimento dos espaços públicos, condição que torna a cidade cada vez pior para a convivência, é a política adotada pela atual administração, que privatiza as áreas públicas. Um exemplo é criação da "vila da Copa". Visando à hospedagem de atletas na Copa do Mundo de 2014, durante dois meses, a prefeitura promove a extinção da última área verde da cidade, a Mata do Isidoro, na zona norte do município. Mais grave ainda é a política de aluguel das praças públicas, como a Praça da Estação. Desde maio deste ano, ela só pode ser ocupada mediante pagamento de caro aluguel à prefeitura. Nessas ocasiões, como a "Arena Fifa-Coca-Cola", que funcionou durante a Copa do Mundo da África do Sul, a área fica cercada e a população não tem acesso a ela.

Quando as futuras gerações não suportarem mais permanecerem presas dentro de apartamentos e shoppings, precisarão derrubar cercas e implodir os arranha-céus erguidos pelas gerações antecessoras, para criar espaços públicos, parques, praças. Talvez corrijam os erros cometidos por Aarão Reis e os engenheiros que o sucederam, reabrindo cursos d'água, despoluindo-os, margenado-os com áreas verdes. Tomara que nessa época a Pampulha não tenha ainda secado, pássaros, peixes e pequenos animas não tenham sido extintos.

domingo, 10 de outubro de 2010

Direita brasileira baixa o nível quando a derrota é iminente

Serra foi buscar na eleição de 1989 o tema que Collor usou para derrotar Lula. Terá o mesmo sucesso?

A insistência da direita brasileira em pregar na candidata do PT à Presidência da República, Dilma Rousseff, a pecha de defensora do aborto não é um fato novo. Serra copiou de Fernando Collor a calúnia que ajudou a elegê-lo em 1989. Naquela eleição, a acusação foi feita contra Lula e abalou o então candidato petista na reta final da campanha, segundo revelou seu assessor de imprensa, o jornalista Ricardo Kotscho, no livro de memórias "Do golpe ao Planalto, uma vida de repórter".

Serra e sua campanha aprimoraram em 2010 os métodos imorais que Collor usou com êxito. Em 1989, o então candidato do PRN pagou à ex-namorada de Lula para dizer no seu programa eleitoral que o candidato petista lhe pedira para fazer aborto, quando ficou grávida da filha Lurian. Esta, que na época tinha 17 anos e morava com a avó, mantinha ótimas relações com o pai e participava da sua campanha. No entanto, o depoimento calunioso da sua mãe foi usado e repetido para tirar votos de Lula. Pior do que isso: "acendeu a luz vermelha na campanha", nas palavras de Kotscho, pois o candidato sentiu profundamente o ataque à sua vida pessoal.

Foi em Belo Horizonte que Lula ficou sabendo da acusação feita por sua ex-namorada Míriam Cordeiro. Ele participava do último comício da campanha na cidade, no dia 12 de dezembro, aniversário da capital, quando o programa de Collor foi ao ar, à noite. Eu estava na redação do JB, vi o programa e fui enviado para ouvir Lula sobre o assunto. Quando cheguei ao palanque, Kotscho me pediu que relatasse em detalhes o que fora dito, pois nem ele nem Lula tinham visto o programa, embora o comando da campanha petista soubesse que o adversário preparava chumbo grosso.

O assunto, aliás, não era novidade: no começo do ano o próprio JB publicara matéria a respeito da filha de Lula fora do casamento (para bem da verdade, diga-se que Lula então era viúvo e não se casou com a mãe de Lurian, apesar da gravidez, no que fez muito bem, considerando o caráter que a ex-namorada veio a revelar), mas nada se falou sobre aborto e o assunto não rendeu. Às vésperas da eleição, Collor o desencavava, com o agravante da acusação que não fora feita antes. O que se pretendia era abalar a confiança do eleitor em Lula, transformado em criminoso e racista. Sim, porque Míriam Cordeiro também disse no programa que Lula lhe confessara que não gostava de pretos.

Kotscho foi a Lula, conversou com ele e o trouxe para entrevista coletiva, pois, a esta altura, todos os repórteres o aguardavam. Lembro que Lula falou pouco, não quis se estender sobre o assunto, não atacou o adversário. "Minha filha é resultado de um ato de amor, não de ódio", disse o candidato petista. "Esse história é velha, cabe à minha filha julgar. É muito baixo nível usar na campanha uma questão familiar."

Na primeira página, no dia seguinte, o JB definiu como "chocante" aquele uso do horário gratuito feito pela campanha de Collor. Já informava também que, segundo uma ex-assessora de Collor, Miriam Cordeiro havia recebido do irmão do candidato, Leopoldo Collor, também coordenador da sua campanha, NCz$ 200 mil (duzentos mil cruzados novos, valor equivalente hoje a cerca de 200 mil reais; o jornal custava NCz$ 5) para prestar o depoimento.

A cobertura do JB demonstra que o comportamento da "velha" mídia (ainda não havia a nova, a web) era equilibrado: se O Globo e a Globo apoiavam Collor, esse apoio não era unânime, como acontece hoje em relação a Serra (a exceção é a Rede Record). Quanta diferença do noticiário de hoje! O JB foi inclusive acusado de apoiar Lula. (Foi o canto do cisne do jornal: quando Collor tomou posse, o jornal, endividado com o governo federal, perdeu sua independência e qualidade.)

O golpe baixo de Collor tinha explicação: ele caía nas pesquisas e Lula subia. O candidato substituíra o comando da campanha, afastando jornalistas e políticos considerados "de esquerda" (Sebastião Nery, Belisa Ribeiro, Zélia Cardoso de Melo e Renan Calheiros), e o primeiro ato do seu irmão foi comprar o depoimento de Miriam Cordeiro. Naquele momento, parecia que Lula venceria a eleição.

Serra usa o mesmo tema e o mesmo método que foi usado contra Lula em 1989: calúnias, apelo aos temores da população, incitamento ao ódio. Provavelmente também o motivo é o mesmo: desespero, iminência da derrota. Psicanalistas observam que a palavra trai: Serra acusa sua adversária Dilma daquilo que ele próprio faz, fez, provavelmente fará.

Em 1989, Collor disseminou o medo de que Lula confiscasse a poupança e foi ele quem fez o confisco. A coleção de Serra inclui número maior de (auto)acusações – no caso do aborto, por exemplo, foi ele que, como ministro da Saúde, autorizou o SUS a realizar "procedimentos de esvaziamento da cavidade uterina". E cometeu ato falho ao discursar aos seus seguidores, depois do primeiro turno: "Eu nunca disse que sou contra o aborto porque sou a favor. Ou melhor...".

Seguindo a técnica de tentar pregar uma marca em Dilma, Serra bate sempre na mesma tecla: ela tem duas caras, ela mente. No entanto, foi ele quem, na campanha para prefeito de São Paulo em 2004, jurou e repetiu insistentemente, até registrou em cartório, a promessa de que não deixaria a prefeitura para se candidatar ao governo estadual, dois anos depois. O que aconteceu? Fez exatamente o que prometeu não fazer. Agora promete salário mínimo de R$ 600, estatizar os Correios (?) e ampliar a estatização (?)...

Este ano, Dilma reagiu, no debate da Band, domingo passado, elevando o tom, rebatendo acusações, acusando também. Em 1989, apesar do ataque sofrido, o candidato do PT decidiu manter sua campanha em alto nível e rejeitou propostas para revidar, usando o farto material disponível de denúncias contra Collor. Também recusou a sugestão de colocar no ar depoimento da filha, defendendo-o. "Não vou deixar que minha filha fale mal da mãe", argumentou.

No debate final, dois dias depois, Lula já se sentia derrotado, segundo Kotscho. A Globo usou seu mau desempenho com estardalhaço, reeditando as melhores cenas de Collor e as piores de Lula, para mostrar, no Jornal Nacional, que o primeiro ganhara o debate de goleada. A calúnia, a baixaria e a manipulação de informações venceram. Em 1989, Lula perdeu. O que acontecerá este ano?

A façanha improvável da direita brasileira

Caso José Serra seja eleito (toc toc toc) presidente no próximo dia 31, será um feito sem precedentes na história do Brasil. E não apenas porque o tucano precisa reverter uma vantagem de 14,5 milhões de votos obtida pela candidata do PT, Dilma Rousseff. É que a direita brasileira nunca conseguiu eleger seu candidato. Num país tão desigual, a imensa maioria pobre sempre preferiu os candidatos da esquerda, mais sensível às aspirações populares. O governo Lula promoveu a ascensão de milhões da classe D para C, elevando sua renda, fazendo surgir uma nova classe média. O voto da classe média é ambiguo e flutuante. Será Lula responsável, indiretamente, pela guinada de parte da população para a direita?

É fato que os candidatos da direita nunca foram populares. Recordemos. A democracia brasileira começou em 1945, com a queda do ditador Getúlio Vargas, ao final da 2ª Guerra Mundial. Getúlio, como todos sabemos, havia comandado um governo autoritário, mas era popular, pois criou a legislação e o sistema estatal que amparam os trabalhadores. Criou também os partidos PSD e PTB. O primeiro presidente eleito foi o general Eurico Dutra, do PSD, apoiado por Getúlio. O candidato da direita era o brigadeiro Eduardo Gomes, da UDN.

O próprio Getúlio foi eleito em 1950, pelo PTB, derrotando o mesmo brigadeiro da direita. Em 1955, Juscelino Kubitschek, do PSD, derrotou novamente outro udenista, o general Juarez Távora.

Para chegar ao poder, em 1960, a direita abriu mão de lançar candidato. A UDN entrou na canoa furada de Jânio Quadros, do pequeno PTN – Partido Trabalhista Nacional, um clone do PTB de Getúlio. Jânio renunciou depois de seis meses, deixando no seu lugar o vice-presidente João Goulart, do PTB. Naquela época, presidente e vice-presidente eram eleitos separadamente, daí a eleição de um vice-presidente de esquerda. Jânio era de direita, mas uma direita populista, que usou seu carisma para juntar o discurso moralista da UDN com os métodos populistas do PTB.

A experiência aventureira da direita com Jânio seria repetida na eleição de 1989, apesar das consequências desastrosas de 1960. Cansada de perder eleições e de novo na oposição, durante o governo Jango, a direita apelou para o golpe de Estado, em 1964. Durante 21 anos ela governou por meio de governos militares. Seguiu-se à ditadura um governo civil eleito indiretamente mediante acordo político das elites. Quando finalmente a eleição direta voltou, a direita viu naufragarem, um após outro, todos os seus candidatos.

Na reta final do primeiro turno, as pesquisas indicavam três candidatos mais fortes, dois de esquerda: Brizola, do PDT, partido herdeiro do PTB, e Lula, do novo PT. O terceiro pertencia a um partido pequeno, sem expressão, o PRN, que mudou de nome às vésperas das eleições – chamava-se PJ, Partido da Juventude. O ex-governador de Alagoas, Fernando Collor, era ainda mais jovem do que Jânio, em 1960. Ele tinha a vitalidade que faltava aos candidatos prediletos da direita e do centro (Mário Covas, do PSDB, Aureliano Chaves, do PFL, Ulysses Guimarães, do PMDB, Paulo Maluf, do PDS, Afif Domingos, do PL) e ainda carisma para conquistar as massas populares errantes.

Prevendo o desastre, a direita mais uma vez embarcou na canoa furada do candidato aventureiro, ainda no primeiro turno. Tapou os furos e ajudou-o manipulando o noticiário (o fato mais notório e de maior repercussão foi a reedição do último debate na tevê pela Rede Globo), para que fosse eleito no segundo turno. (Collor apelou tambem para baixarias, usando o mesmo tema ao qual Serra recorre este ano contra Dilma, o aborto – como vimos em outro artigo.)

Deu no que deu. Collor, assim como Jânio, não terminou seu governo. O aventureiro não se mostrou confiável e, aos poucos, a direita lhe retirou apoio, até que um processo de impeachment, precedido de ampla mobilização popular, afastou o primeiro presidente eleito diretamente depois da ditadura militar.

O presidente eleito em seguida, Fernando Henrique Cardoso, do PSDB, foi uma exceção. A direita conseguiu pelo primeira vez eleger o candidato dos seus sonhos e governou com ele durante oito anos. Esta exceção foi possibilitada por fatores extraordinários que só confirmam a regra. Em primeiro lugar, os tucanos não tinham ainda se identificado tão claramente com a direita – no segundo turno da eleição de 1989, por exemplo, apoiaram Lula.

Em segundo lugar, e fator mais importante, FHC foi eleito como o candidato do Real, o plano de estabilização econômica cujos primeiros resultados atenderam a um desejo popular que remontava à ditadura. Pela primeira vez em quase vinte anos, a inflação foi controlada e a economia começou a crescer, gerando empregos e oportunidades. Este fato fez com que o presidente Itamar Franco, vice que concluiu o mandato de Collor, conseguisse eleger seu candidato e ministro da Fazenda, apresentado como responsável pelo sucesso do plano.

No governo FHC os tucanos completaram seu deslocamento da centro-esquerda para a centro-direita, transitando da social-democracia para o neoliberalismo, adotando a política ensaiada pelo presidente afastado e alinhando-se com as orientações econômicas do governo americano.

A lua-de-mel dos tucanos com o eleitorado durou cerca de cinco anos, tempo suficiente para que FHC aprovasse emenda constitucional que instituiu a reeleição e fosse reeleito. No segundo mandato, entretanto, a economia começou a desmoronar e com ela a breve popularidade da direita brasileira. Quando ficou evidente a incompetência da direita para conduzir a economia e manter beneficios duradouros para a maioria da população, esta se voltou para a esquerda novamente, elegeu Lula em 2002 e o reelegeu em 2006.

Os fatos são estes e, como disse, é compreensível que seja assim, num país tão profundamente desigual e antidemocrático quanto o Brasil. Lula recolocou o trem da história de novo nos trilhos. O candidato da direita nunca venceu uma eleição, quando a direita chegou ao poder foi porque apoiou candidatos aventureiros que não terminaram seus mandatos. A única exceção foi FHC, o qual, entretanto, não se apresentou como candidato da direita contra a esquerda, mas candidato da continuação da estabilidade econômica, de cujos benefícios a maioria de população desfrutava.

Nem em 1994, nem em 1998 e nem mesmo em 2002, a eleição se apresentou como se apresenta este ano, um combate entre candidatos de direita e de esquerda, com propostas de governo distintas, que podem ser comparadas não apenas em discursos, mas em experiências de governo. Dilma tem todos os fatores a seu favor, da força eleitoral histórica da esquerda aos benefícios que ela gera para a maioria quando está no governo.

Nenhum desastre nos ameaça, nenhuma decepção abala as simpatias esquerdistas da maioria da população, reforçadas pelos êxitos espetaculares e surpreendentes do governo Lula. A economia nunca esteve tão bem. Vencer esta eleição seria uma façanha sem precedentes para a direita brasileira. É difícil imaginar que ela esteja reservada a um candidato tão antipático e arrogante quanto Serra.

sábado, 9 de outubro de 2010

O PT e a conquista dos eleitores da Marina

O assunto da semana foi Marina. O raciocínio que orientou o noticiário político é lógico: Dilma não venceu no primeiro turno, ao contrário do que indicavam as pesquisas; o desempenho de Marina superou as expectativas, e ela teve mais de 19% dos votos válidos (em Belo Horizonte conseguiu a proeza de ficar em primeiro lugar); esses votos serão decisivos no segundo turno, o apoio da candidata verde merece toda atenção. Discordo desse enfoque e, considerando a visita de Dilma a Belo Horizonte quarta-feira passada, suponho que o comando da campanha do PT também. O que importa não é conquistar Marina e seu partido, mas seus eleitores.

Na verdade, a lógica eleitoral é outra. Se candidato e eleitores se identificassem de forma tão completa, os 80% que aprovam Lula teriam votado em Dilma, no primeiro turno. A transferência não é automática: se Marina vier a apoiar Dilma não passará seus 20 milhões de votos para a candidata do PT. Tampouco se a cúpula do PV confirmar apoio a Serra – como anunciou o presidente do partido, José Luiz Penna, antes mesmo do primeiro turno – irá transferir para ele os votos obtidos no dia 3 de outubro.

Vinte milhões de brasileiros escolheram Marina no primeiro turno. Por vários motivos, eles a consideraram a melhor candidata. No segundo turno, porém, ela não estará presente. Mais do que para qualquer eleitor, para o eleitor de Marina Silva, o segundo turno é outra eleição, ele terá de optar entre Dilma e Serra. Ou votar nulo, como já disseram alguns. A parte que cabe a Marina e ao PV no assunto é: quanto eles conseguirão influenciar nessa escolha?

O PV é um balaio de gatos e hienas, congrega desde ambientalistas até políticos oportunistas que buscam uma legenda simpática para se abrigarem. As dissenções explicitadas esta semana na ânsia com que dirigentes negociam cargos no possível governo Serra mostram isso. Não se pode dizer que o PV seja controlado pelos militantes da causa ecológica. Em Minas, por exemplo, o megaempresário Vitório Medioli, dono da Sada transportadora e de outras empresas, além dos jornais Super, O Tempo e Pampulha, ex-deputado federal tucano por quatro legislaturas (1991-2007), inimigo ferrenho do PT, ingressou no PV em 2005 e disputou a prefeitura de Betim, em 2008, como candidato a vice-prefeito. Perdeu.

Marina representa o que o PV tem de melhor. Ela é também muito maior do que seu partido, assim como Lula é maior do que o PT. Sem Marina, o PV encolhe a um décimo, como aconteceu na eleição para governador em Minas, em que o candidato verde José Fernando teve 2,4% dos votos válidos. Foi o Movimento Marina Silva, muito mais do que o PV que, nesta eleição, congregou ambientalistas e simpatizantes de uma "terceira via". Não à toa, a ex-candidata sustenta que também eles devem participar da decisão sobre o segundo turno, com o que não concordam os dirigentes verdes. Na Executiva do partido, segundo informou a Folha de S.Paulo, Marina – que fez carreira política no PT e só se filiou ao PV em 2009 – tem apenas 10 dos 60 votos.

Se o PV é muito menor do que Marina, tampouco a liderança da candidata verde está consolidada. Esta foi sua primeira eleição para presidente. Muitos consideram que ela capitalizou o voto de protesto de uma parcela da população que não gosta do PSDB e se desiludiu com o PT. Pode ser o caso de Belo Horizonte, cidade em que, há dois anos, o PT jogou no lixo seu capital político, ao entregar o governo, depois de quatro mandatos, para um aliado do governador tucano Aécio Neves, num acordo político até hoje nebuloso. Marina foi a preferida dos belo-horizontinos, conquistando aqui 39,88% dos votos válidos, superando Dilma (30,92%) e Serra (27,73%).

A votação no estado, diferentemente, ficou bem próxima do resultado nacional, o que é comum: o mineiro é tradicionalmente uma espécie de média brasileira. Em Minas, Dilma ficou em primeiro, com 46,98%; Serra ficou em segundo, com 30,76%, e Marina, em terceiro, com 21,25%. Prevaleceu no estado o voto Dilmasia, que deu a vitória no primeiro turno ao governador Antônio Anastasia, reeleito com 62,72%.

O que os números indicam, mais do que a surpreendente popularidade de Maria Osmarina da Silva Vaz de Lima, em Minas como no Brasil, é que parcela significativa de eleitores busca um novo caminho. Em Belo Horizonte esta parcela é o dobro. Por isso, em vez de esperar o apoio de Marina, Dilma fez muito bem em retomar sua campanha no segundo turno na nossa cidade. Afinal, ela nasceu e tem raízes aqui. A candidata do PT precisa convencer os 560.037 belo-horizontinos eleitores de Marina que votar nela é uma opção melhor do que votar nulo ou em Serra.

Sua tarefa não é fácil: os errantes eleitores da capital deram ao governador tucano votação acachapante: 71,48%, bem superior à média do estado. A favor de Dilma pode-se dizer que esses votos também não serão transferidos automaticamente para o candidato tucano, como não o foram no primeiro turno; de certa forma, Anastasia, a exemplo de Aécio, nunca se apresentou como inimigo de Lula, como fizeram Serra e os tucanos paulistas. Anastasia representa a continuação tanto quanto Dilma.

Os melhores quadros petistas devem se engajar nessa campanha como nos velhos tempos. Têm motivos de sobra para isso: em Belo Horizonte, no segundo turno desta eleição presidencial, está começando a eleição para prefeito de 2012. Reverter o resultado do primeiro turno pode ser um passo importante para o renascimento do PT belo-horizontino.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Carta a um amigo que vai votar nulo

Eu não ia tocar no assunto, mas já que você falou... A eleição. Você sabe que penso completamente diferente de você, mas não vou tentar te convencer. Estou impressionado com a quantidade de amigos ou conhecidos que não votaram na Dilma no primeiro turno.

Eu votei, diferentemente de 2006. Em 2006, eu votei no Cristovam Buarque, no primeiro turno, pela ênfase que sua campanha deu à educação. De lá pra cá li muito, acompanhei as coisas pela internet, descobri essa revolução na informação que é a web. Vi como a chamada "grande imprensa" manipula as informações. Não que eu não soubesse, mas pensava que as denúncias tinham um fundo de verdade, e que o PT era igual aos outros partidos, que Lula tinha traído seus eleitores.

Este ano vi tudo se repetindo, mas vi com outros olhos. Vi como são grotescas as mentiras, as notícias fabricadas, os exageros, a manipulação de informações.

Globo, Folha, Estadão e Veja inventam descaradamente porque estão a serviço do Serra e querem elegê-lo, custe o que custar. Este ano confessaram isso várias vezes. Só que não dizem isso no noticiário, dizem em editoriais que ninguém lê e seminários aos quais ninguém vai. Mas estão ao alcance de quem se informa pela nova mídia, pela web.

A velha mídia representa o que há de pior e de mais reacionário no Brasil. Repete as mesmas campanhas que levaram ao golpe de 1964 e a 21 anos de ditadura. Qualquer pessoa razoavelmente informada hoje sabe que o governo Lula foi mil vezes melhor, em tudo, em qualquer área que se compare, do que o governo FHC. O governo Dilma não vai ser igual, ela não é Lula, mas quem sabe não vai ser melhor?

Lula me surpreendeu. Ele entrou para a história do Brasil e prevejo que esses últimos anos serão lembrados como uma "era de ouro", um período de progresso e liberdade, como nos lembramos até hoje dos anos JK. Principalmente (toc toc toc) se as coisas piorarem, como pioraram depois de JK.

Acho que a melhor comparação dessa eleição é aquele programa de televisão em que o sujeito fica numa cabina sem ver nem ouvir nada e tem que responder à pergunta: você troca isso por aquilo? E o cara vai trocando às cegas, às vezes troca uma casa por um par de sapatos furados. Se o Brasil elegesse Serra seria mais ou menos isso.

Um possível governo Serra, se for igual ao governo FHC, de quem ele é pupilo, seria péssimo. Se fosse um governo como ele fez em SP (todo mundo que convive com ele diz que é um sujeito autoritário, arrogante), será uma volta ao moribundo neoliberalismo.

Se Serra fossse eleito e fizesse o que muitos temem que faça (destruir tudo o que o governo Lula fez, aprovar uma emenda constitucional para impedir que Lula possa ser eleito em 2014, censurar a internet etc., liquidar os programas sociais que considera esmola e vício de vagabundos), aí seria mesmo um retrocesso similar ao que aconteceu no país nos anos da ditadura militar.

Serra é um cara em quem não se pode confiar, porque é capaz de falar qualquer mentira para ganhar voto. Em 2004 jurou que se fosse eleito prefeito de São Paulo não disputaria a eleição para governador, dois anos depois. Disputou. Este ano está fazendo promessas que não vai cumprir, como aumentar o salário mínimo e ampliar o Bolsa-Família. São os próprios tucanos que estão espantados com isso.

Espero que Dilma seja eleita. Sei que tem uma classe média que ainda acredita em Globo, Folha, Estadão, Estadinho, Veja. Em BH, como demonstrou a vitória da Marina no primeiro turno, essa classe média é forte. O eleitorado da capital procura um novo rumo, depois que o ex-prefeito Pimentel jogou fora 16 anos de construção de um governo democrático e social, ao apoiar a candidatura de um empresário milionário indicado pelo governador Aécio Neves.

Essa classe média, da qual faço parte, é moralista, tem horror a escândalos, e é isso que a "grande imprensa" explora. Só que os escândalos dos seus políticos essa imprensa esconde. Aécio passou oito anos censurando a imprensa mineira, nenhuma denúncia contra ele foi publicada. Será por que ele e todos os seus são os governantes mais honestos do mundo? Não acredito. Se a imprensa fosse contra ele, teria denúncia todo dia, como tem contra o governo Lula, como tinha contra o ex-governador Newton Cardoso.

Corrupção não é minha referência, porque todo governo tem. Pra gente saber que governo é mais ou menos corrupto, precisava de imprensa independente – o que não temos – investigando igualmente todos os governos – o que não acontece. E tinha de ter parlamentares sérios e honestos, tinha de ter judiciário imparcial, o que também não é a regra.

Minha referência é o que o governo fez. Deixando de lado o crescimento da economia, o sucesso da Petrobrás, os êxitos em cada área, a elevação da autoestima nacional e o reconhecimento internacional do presidente Lula, o que eu vejo é que a vida do povo melhorou. Tem mais emprego, milhões deixaram de ser miseráveis, milhões estão ganhando melhor. Não é à toa que o governo Lula tem aprovação de mais de 80% e só 4% dizem não gostar dele.

Grande parte dessa população beneficiada pelo governo Lula não votou no primeiro turno. A abstenção, os votos nulos e brancos foram muito altos, principalmente no Norte e no Nordeste. Acredito que no segundo turno essa gente votará em Dilma, mesmo porque a votação é simples, entre dois números, não é como no primeiro turno, um punhado de escolhas que intimidam os mais humildes e menos afeitos à tecnologia. Acho que esses brasileiros, que constituem a maioria, não vão querer trocar o que está bom para eles por um punhado de promessas vindas de gente que eles conhecem de outros carnavais.

Mas não me iludo: depois que Dilma for eleita, a guerra vai continuar, os reacionários e sua imprensa vão continuar com seu denuncismo, vão tentar impeachment, vão tentar dar golpe militar, vão fazer de tudo para prejudicar seu governo, vão fazer chantagens com a nova presidente. Essa gente não aceita perder o poder, não aceita ver o povo mais feliz, com a vida melhor. Embora se autodenominem democratas, isso é o que não são. Freud explica. Mesmo ganhando muito, eles querem mais, eles querem tudo, toda riqueza e todo poder, como tinham na ditadura e no governo FHC.

Outro dia, no facebook, um jornalista que critica Dilma, argumentou que não tinha de escolher um lado na eleição, que política não é Fla-Flu. Realmente, política não é Fla-Flu, porque no futebol a gente não escolhe time, a gente é escolhido, desde pequeno; quando vê, já tem um time de coração. Mesmo que ele perca, vá pra segunda divisão, pra terceira, a gente sempre acha que é o melhor time do mundo. Meu amigo de infância americano continua indo a todos os jogos do seu time, torcendo para que ele volte à primeira divisão. Eu estou aqui sofrendo pelo meu Galo, feliz porque agora está demonstrando raça, ainda que seja quase um milagre escapar do rebaixamento, mas, como disse um alvinegro famoso, o atleticano torce contra o vento no meio da tempestade. Se o clube escapar, a paixão vai aumentar. Futebol é assim.

Política é diferente, é na política que a gente tem sempre de escolher um lado. Às vezes escolhe com o coração, às vezes escolhe com a razão. Melhor é quando coração e razão se juntam. Ruim é fechar o coração e não deixar a razão funcionar, porque um lado vai vencer – com nosso apoio, contra ele, ou com a nossa indiferença.

Na eleição deste ano, a gente tem de escolher entre a continuação provável de um governo do primeiro presidente que veio do povo e não traiu sua origem e a volta daqueles que sempre tiveram compromissos com os empresários, com os mais reacionários, com as multinacionais e até com a ditadura militar. Meu voto não vai decidir a eleição, mas me deixa em paz com a minha consciência, que é o máximo que eu posso fazer.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

O desastre do PT em Minas

O pior resultado eleitoral do PT, ontem, foi provavelmente em Belo Horizonte. O tucano Anastasia foi eleito governador com mais de 62% dos votos válidos; Hélio Costa, do PMDB, que nas primeiras pesquisas aparecia como favorito, com mais de 40% dos votos, caiu para 34%. A eleição foi decidida no primeiro turno. Dilma venceu no estado, como rigorosamente o mesmo índice nacional (46,9%), mas na capital quem ficou em primeiro lugar foi Marina, do PV, com 39,8% (Dilma, 30,9% e Serra, 27,7%).

Além de não conquistar o governo estadual, o PT não conseguiu eleger os candidatos da coligação ao Senado e fez pequenas bancadas federal e estadual.

Há dois anos, o PT administrava Belo Horizonte, pelo quarto mandato consecutivo, além de várias prefeituras importantes no interior, e mantinha boas relações com o governo estadual. Hoje, a prefeitura está nas mãos de um aliado do governador, que foi reeleito. Pela segunda eleição consecutiva, o PT não apresentou candidato ao cargo titular, ficou com o vice. E mesmo assim perdeu a eleição.

Em 2008, foi diferente: sua chapa venceu, mas foi uma vitória de Pirro, como se viu depois, pois o "sacrifício" se justificaria em nome de conquistar, este ano, o governo estadual. O PT assumiu uma posição subalterna na prefeitura e perdeu força no estado.

O mais curioso de tudo é que essa decadência não se deveu a más administrações. Recordemos: há dois anos, o então prefeito Fernando Pimentel tinha excelente avaliação popular. Tinha grande chance de eleger seu sucessor (ele já exercera dois mandatos consecutivos) e atingir duas décadas de administração petista em Belo Horizonte.

Enganado pela soberba e pela ambição política, fez, porém, um estranho acordo com o governador tucano Aécio Neves, cujos termos nunca ficaram claros. O fato é que o PT abriu mão de disputar a prefeitura com candidato próprio e contentou-se em indicador o candidato a vice na chapa apoiada pelo governador. Isso teria sido feito em nome da unidade em Minas, a favor da população, que só teria a ganhar. O que se imaginou na época era que Pimentel seria candidato a governador, este ano, e teria apoio do governador. Em troca, Pimentel daria ainda apoio ao tucano, candidato a presidente.

Nada disso aconteceu: Aécio não conseguiu a indicação do seu partido à Presidência, Pimentel venceu Patrus Ananias nas prévias internas do PT, mas teve de se curvar à decisão nacional de não lançar candidatura própria ao governo de Minas e se contentar com a indicação do candidato a vice do aliado PMDB. Esse vice foi Patrus, ficando Pimentel com a candidatura ao Senado, mesmo cargo disputado por Aécio.

Isso não teria importância, pois havia duas vagas em disputa, mas Aécio abraçou mais uma candidatura, a do ex-presidente Itamar Franco, do PPS. Pimentel viu então seu aliado Aécio e seu apaniguado Lacerda fazendo campanha contra sua eleição, no palanque adversário. Como se diz na linguagem popular, Pimentel armou e se deu mal.

Esse caminho de ambição e traição, ascensão e queda de Pimentel, não trouxeram ganhos à sua carreira política, mas deram muito mais prejuízos ao PT e à esquerda mineira. Para tentar alcançar seu objetivo de ser governador de Minas, o ex-prefeito fez filiações em massa no seu partido, segundo denúncias de adversários internos, de forma a conquistar a maioria nos diretórios municipal e estadual. Isso desgastou e dividiu o partido e enfraqueceu a militância, que pouco participou da eleição do diretório e da prévia. Houve até mesmo denúncias de fraudes.

A imposição pela direção nacional da candidatura de Hélio Costa, além se mostrar eleitoralmente desastrosa, colaborou ainda mais para desmotivar a militância, que pouco se engajou na campanha eleitoral. Prova disso é que um ex-ministro de Lula e ex-candidato a governador na eleição passada, quando obteve 2,1 milhões de votos, não conseguiu nesta eleição os cerca de 80 mil votos que o levariam à Câmara dos Deputados.

Depois desta eleição, o PT mineiro precisa começar outra vez, praticamente do zero, precisa se reinventar numa cidade que é dirigida pelos PSDB e seu aliado PSB e cujo eleitorado demonstrou preferência pelo PV. Quais são as novas lideranças do PT? Quem poderá ser o novo Patrus Ananias, que há 18 anos começou a escrever a história da esquerda na capital, derrotando a velha direita (Maurício Campos) e a nova direita (Aécio Neves)?

Talvez não exista um novo Patrus, talvez a missão de recomeçar caiba novamente a ele. Como última reserva do PT mineiro, talvez em 2012, Patrus tenha se sacrificar e disputar novamente a prefeitura de Belo Horizonte, para retomar o que começou e Pimentel liquidou.

Antes disso, porém, temos o segundo turno. Dilma, que venceu em Minas no primeiro turno, precisa repetir esse resultado no segundo turno. Precisa herdar os votos de Marina e impor aos demotucanos uma forte derrota no estado. Minas precisa confirmar que está com Aécio, mas não está com Serra, que não está com Hélio, mas está com Dilma. Certamente, os derrotados Hélio Costa e Pimentel que conseguirão isso. Patrus, porém, que entrou na campanha com a humildade de quem sabia que deveria ser o titular e a dignidade de quem não tem ambições pessoais, poderá pedir votos mais uma vez de cabeça erguida.