quinta-feira, 11 de novembro de 2010

1977

Meu ponto de vista é que éramos os revolucionários e os democratistas, os reformistas – por outra: nós, os bolchevistas, eles os menchevistas. Não lideramos o movimento estudantil em 1977 nem o movimento operário em 1978; a Polop (P.O., ORML-PO, Organização Revolucionária Marxista-Leninista Política Operária) desintegrou-se quando vieram as mobilizações de massa de 77.

O movimento social seguiu a linha reformista, dos democratistas, que passaram a adorar Lula e fundaram o PT. Marcelo foi da Liberdade, tendência democratista majoritária, mais sensata; reagiu ao meu depoimento “magoado”. Entrou na UFMG em 1978, não viveu o pré-77 nem 77. Falamos sobre muita coisa que pode ser feita e sobre a importância daquele período. Ele lamenta que “o elo do M.E.” tenha se perdido.

Chegamos à conclusão central sobre o assunto: aquela idade (20 anos) e aquele local (a universidade) são as condições naturais para a rebeldia. Jovens contestavam as estruturas antigas e criavam o novo. Naquela idade éramos aventureiros, corríamos todos os riscos. Os jovens não se rebelam mais. Ao mesmo tempo, todo mundo hoje é jovem, o homem de 60 anos ainda se veste como jovem, juventude virou um mercado, um estilo de consumo. Foi isso que mudou. Acabou a velhice ou acabou a juventude? Foi o velho que se tornou jovem ou o jovem que se tornou velho?

Muitas idéias:
1) Um museu na UFMG; o movimento estudantil como parte importante dele.
2) Um espetáculo do TREF: uma assembléia estudantil como em 77, com mesa, inscrições, questão de ordem, discursos dos representantes de cada tendência, deliberação.
3) Uma edição especial do Cometa sobre o 4º ENE.
4) Deflagrar agora um processo para culminar no ano que vem, com os 40 anos de 1968.
5) Página especial de opinião do Tempo com artigos de diferentes tendências analisando 1977 e o 3º ENE.
6) Pesquisar os registros da repressão na biblioteca central da UFMG.
7) Marcelo tem farto material sobre o ME na Fafich a partir de 1978.
8) Antes de 1977; 1977, o ano que começou diferente, as jornadas de maio e junho, a reunião da SBPC em Brasília; 1978: São Bernardo, movimento pela anistia; 1979: reconstrução da UNE, anistia; 1980: Roseta, o último suspiro. Nesse período: assembléias, atos públicos, passeatas, contatos com outros setores, jornais de DA, Gol a Gol, Boca a Boca.

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Boca a Boca

Fazer uma nova edição do Boca a Boca: 1977, trinta anos depois. Nas páginas centrais um debate com as lideranças. Olhar para trás, avaliar, comparar hoje e ontem, discutir questões como ética, que naquele momento não estava colocada, parecia consensual, porém, não é bem assim: de que ética falamos? Havia uma idéia de ética revolucionária, uma ética que servisse à causa. Isso existe? Os dirigentes do PT, herdeiros dos militantes revolucionários de 1977, praticam aquela ética da qual tínhamos uma idéia vaga durante a ditadura militar?

Lembrei-me de uma frase que Jesus gostava de repetir naqueles dias, seguida de gargalhada: “A burguesia tem duas coisas que eu quero: os meios de produção e as mulheres”. Ela me fez lembrar de Jesus pontificando nos espaços da Fafich, mas ele não estava sozinho, lembrei-me de Reinaldo, ambos com cavanhaques leninistas, ambos carismáticos, ambos capazes de fazer discursos articulados, com entonação apropriada para o momento, dando pausas e olhando nos olhos dos colegas ao redor.

Tudo aquilo era um teatro e eu o sei bem, pois participei dele, mas participei como subalterno numa tendência minoritária e marginal. Jesus falava para os estudantes da Fafich como quem fala para amigos e admiradores, e ele, ao contrário de mim, era realmente querido por muitos, porque no dia-a-dia estava mais próximo deles.

Aquele discurso informal era, porém, estudado, posso imaginá-lo treinando com João Batista dos Mares Guia, o grande orador da geração estudantil anterior, de 1968, e este lhe dando instruções como um treinador que não pode entrar em campo dá aos seus jogadores. Em momentos mais importantes, o próprio João comparecia às assembléias, para observar e dar conselhos nos bastidores.

Tenho consciência, agora, que Jesus e sua turma já estavam destinados a ocupar postos melhores na sociedade. Naquele momento mesmo eles mantinham relações melhores e mais amplas com setores sociais da classe média (não é à toa que seu irmão, ex-padre, foi deputado e é embaixador). Enquanto eu, quem era eu? Ninguém, e tinha a chance de ser alguém apenas se viesse a revolução. Nossas vidas já estavam marcadas naquela época. Sua origem social (sem menosprezar seus méritos pessoais) dera a Jesus a liderança do movimento estudantil na Fafich e a presidência do DCE UFMG, assim como suas relações o levariam a uma profissão importante, ao destaque profissional, a pós-graduações no exterior.

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