(Se eu quiser aguentar o tranco tenho de sair daqui a pouco e nadar pelo menos meia hora. Quando volto, mal dá pra fazer alguma coisa e é hora de almoçar pra sair. A volta, só às nove da noite, na melhor das hipóteses, e tão cansado que só quero saber de comer e deitar no sofá.)
Está sendo uma experiência interessante. Eu te contei como pensei em ir trabalhar no jornal? Estava passeando com as meninas perto de casa, de tarde, começo de janeiro. Demos uma bela caminhada até o alto da Francisco Deslandes, onde tem um shopping novo. Eu queria trocar uns presentes de Natal lá perto. E então encontro um colega, um sujeito com quem trabalhei na cooperativa, logo que formei, e que depois trabalhou no Globo, quando eu trabalhava no JB. Olhei pra ele e pensei: que vida boa. Ele trabalha no jornal, tinha dado uma escapada pra resolver um assunto e ia voltar. No dia seguinte comprei o jornal e vi umas notas que ele tinha escrito sobre problemas na rua, que ele viu no caminho, e que eu também vira. Fiquei pensando que o jornal seria um bom lugar para eu me aquietar: trabalho tranquilo, com horário, salário garantido. No tempo livre faria minhas coisas. E eu precisando de dinheiro. O Zé tinha me oferecido um serviço, mas achei que o jornal seria mais interessante, se desse certo. Passei um e-mail para um chefe de lá que eu conhecia perguntando se não tinha alguma coisa e ele me respondeu, sondando para ser repórter de política. Topei e a coisa se resolveu em dois dias. Na prática, estou substituindo um repórter que está de férias, mas depois, quem sabe? Pra mim também era bom que fosse assim, porque eu queria experimentar. O que aconteceu? Logo de cara, a situação mudou completamente: o que seria tranquilo, virou ansiedade. Isso antes de começar. Eu precisava aprender a usar o programa do jornal, cheio de comandos novos, e aquilo me assustou. O computador com letras miúdas, o ambiente, a pressão de horário, tudo me assustou e eu quase entrei em pânico, pensando que estava doido, que não ia dar conta, que ia dar vexame. Então pus os equipamentos do meu jeito, pedi ao pessoal do suporte para reconfigurar o vídeo pra mim, experimentei o programa e vi que dava para prosseguir. Comecei. O pessoal foi simpático e as pautas foram leves. O problema era cobrir política: os políticos de férias e a falta de fatos. É um tal de escrever o que os outros falam, quase sempre igual, com mudanças mínimas. Um fala uma coisa, o outro fala o contrário. De vez em quando a gente sai pra rua, e aí é melhor, lembra o JB, mas quase sempre fico na redação, sete horas seguidas, falando no telefone, escrevendo no computador ou simplesmente lendo. Ontem, terminei pouco depois das seis da tarde e fiquei mais de duas horas à toa, sentado diante do computador, esperando dar o horário, no meio de um monte de gente. Que trem aborrecido! E cansativo! Mas o pior é que ver que só faço aquilo pelo dinheiro, que não o trabalho não tem significado nenhum pra mim, que jogo fora sete horas (oito, contando meia hora pra ir e meia hora pra voltar) todos os dias. Sabe por quê? Vários motivos. O jornal é uma coisa antiga, a internet revolucionou o jornalismo, com a produção imediata, juntando texto, imagem e som, e principalmente dando voz ao leitor. A informação agora é construída por todo mundo junto. No entanto, os jornais continuam sendo feitos do mesmo jeito. O jornal onde trabalho tem uma característica própria: ninguém ali pensa muito no que está fazendo, vai fazendo, um dia após o outro, do jeiro que sempre fez. A única mudança é o programa de editoração, que aboliu o diagramador, agora é o editor que monta a página, escolhendo num cardápio, e o repórter ajuda, já escrevendo na página, ajustando estilos etc. O jornal tem um portal na internet, mas o usa da mesma forma que faz o jornal, inclusive com notícias do jornal. Não é assim que se faz jornalismo na internet. Então é isso, meu trabalho não tem significado para mim, fico sentado sete horas direto, fico à toa, cobrir política é uma coisa esquisita, a gente só escreve bobagens que os políticos falam, fica repetindo a mesma coisa todo dia. Tem também as coisas de relacionamento, o chefe que gosta de passar pitos, colegas nos quais a gente não sabe se pode confiar, não é aquele clima do JB. Enfim, pra essa rotina valer para os meus próximos anos, teria de ter tempo pra fazer outra coisa que valesse a pena. É por isso que cheguei à conclusão que vou ganhar a vida de outra forma. E o que eu quero é mais ou menos o que o Cláudio fez: mudar para um lugar pequeno e agradável, em que eu conheça as pessoas, ande a pé, conviva com a natureza, e tenha um negocinho para ganhar dinheiro e pagar as contas. Eu não estava errado ao pensar que o jornal era um lugar tranquilo para o meu colega. Ele trabalha do meu lado, faz o horário dele, publica o que quer, tira dias de folga para viajar, esquia na lagoa de Contagem, passeia de barco em Escarpas do Lago, não trabalha nos fins de semana, mas ele está lá há mais de dez anos, conquistou esses privilégios e é amigo do chefe, tem muitas relações com gente importante. Quem sou eu pra isso? Nem agora nem daqui há dez anos. Quando terminar meu contrato, vou tentar mudar de área. Se não der, continuo na política enquanto aguentar, e se o jornal quiser.
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